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Investigado pelo Ministério Público, “Flavio Bolsonaro” diz que processo deve ser anulado, por ser ilegal

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O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) disse ao Estado que o Ministério Público do Rio de Janeiro está preparando uma manobra para dar “verniz de legalidade” à investigação da qual é alvo.

Segundo ele, é por isso que os promotores correm agora para conseguir da Justiça a quebra de seu sigilo bancário e fiscal. “Para que esse pedido, se meu extrato já apareceu na televisão? Eles querem requentar uma informação que conseguiram de forma ilegal”, disse, em entrevista exclusiva ao Estado. “Não tem outro caminho para a investigação a não ser ela ser arquivada – e eles sabem disso”.

Filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, Flávio passou a ser investigado após o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificar movimentação financeira considerada atípica em sua conta corrente e na de seu ex-assessor, Fabrício Queiroz. O caso foi revelado pelo Estado.

Ele nega que tenha cometido irregularidade e pedido que seus funcionários devolvessem parte do salário. Afirma, contudo, que as versões dadas até agora por Queiroz, com quem trabalhou por mais de dez anos, soam estranhas e diz que ele precisa se explicar. “Talvez tenha sido meu erro confiar demais nele”, disse. Flávio disse que não sabe onde Queiroz está.

Veja os principais trechos da entrevista, concedida na manhã deste domingo ao Estado.

Onde está Fabrício Queiroz?

Como é que eu vou saber? Ele tem um CPF e eu tenho outro. A última vez que falei com Queiroz, foi quando ele teve cirurgia do câncer e liguei para saber se estava tudo bem. E nunca mais falei com ele. Não sei onde ele está, não tenho informação da família, não sei nada.

Mas ele trabalhou muitos anos para o senhor.

Sim, trabalhou. Ele tinha a minha confiança. Na época, ele tinha.

Não tem mais?

Está demonstrando que não é merecedor dela. A demora dele em falar me atrapalhou muito. Fui sendo fritado enquanto ele não falava nada.

Ok, mas o senhor não é investigador, não é do Ministério Público. Para o senhor, não era importante entender o que de fato aconteceu?

Era importante, mas aí ele descobriu o câncer, foi operar e eu não falei mais com ele. Foi questão de um mês que isso tudo aconteceu.

Por que não procurar, por exemplo, a Nathália Queiroz, que também foi sua funcionária, para que ela explicasse pelo pai, já que ele estava doente?

O Queiroz tinha muita autonomia dentro do gabinete para escolher as pessoas, principalmente as equipes que eu chamo de equipe de rua. Ele que geria isso tudo. Talvez tenha sido meu erro confiar demais nele. Ele me pedia: “Poxa, dá para colocar minha filha para trabalhar?”. Meu gabinete sempre foi muito enxuto. Minha campanha sempre muito barata. Abria espaço no meu gabinete e eu, na confiança, dizia: “Pode colocar, monta isso aí, não tem problema”. Quem tem que cobrar agora explicações é o Ministério Público. Óbvio que cobrei também, mas ele não me deu as explicações precisas à época, me deu de forma genérica. Agora é o Ministério Público que tem de apurar. Talvez meu erro tenha sido esse: confiar demais nele, sem dúvida.

É correto terceirizar dessa maneira, sem olhar atentamente, sem investigar melhor alguém tão central em sua equipe?

Não tem sentido. Vou ficar desconfiando, investigando todo mundo que trabalha comigo? Agora é fácil falar. Na época, como saber?

Ele tinha confiança do seu pai?

Com certeza, ou não teria vindo trabalhar comigo. Ele convivia mais comigo. Mais de dez anos trabalhando comigo quase todo dia. Eu estava mais junto com o Queiroz algumas vezes do que com a minha família. A relação foi sendo construída, de confiança. Mas eu não tinha como prever, como ainda não há o que eu possa ter convicção, de que houve ilegalidade. Foi um papel muito sujo do procurador de Justiça do Rio.

Mas, senador, como o senhor pode afirmar que ele vazou a informação?

Posso. Pedimos habeas corpus no Tribunal de Justiça do Rio. Ficou lá por dez dias. Você viu alguma coisa na imprensa? Não, porque o desembargador tomou cuidado de cumprir a lei. Aí dá vista ao Ministério Público e quase que, imediatamente, cai na imprensa. Estou sendo vítima no Rio de Janeiro de uma perseguição implacável. Porque, em relação a vários outros deputados, não está sendo feito da mesma maneira.

O principal ponto dessa história é saber se houve ou não a “rachadinha”, que é a devolução de parte do salário do servidor.

Claro que não houve. Não tinha isso no meu gabinete. Queiroz se sentou comigo na mesa quando empresários queriam doar alguns milhões de reais na campanha. Neguei na frente de todo mundo.

Mas o que isso tem a ver com devolver parte do dinheiro dos funcionários?

Ele estava vendo qual era a minha postura. Se eu quisesse dinheiro, eu aceitava. Essa historia de rachadinha não tem liga com o histórico do nome Bolsonaro. Se eu quisesse esse dinheiro, eu estava rico. Talvez estivesse preso. Não tem por que o Queiroz ter feito isso. Se fez, o que eu não acredito, foi obviamente sem o meu consentimento. Ou eu seria o primeiro a cortar a cabeça dele.

Queiroz, primeiro, não quis falar nada. Depois, falou na TV que fazia dinheiro com venda de carros. Depois, deu outra versão, dizendo que pegava esse dinheiro para aumentar o gabinete do senhor. Não é estranho, a cada hora, uma versão?

Acho estranho, ele tem que explicar qual é a verdade. Ele que sabe.

Queiroz se internou no hospital mais caro do pais, o Albert Einstein. Esse tipo de comportamento…

Claro que é estranho. Mas, de novo ele, tem que explicar. Certamente deve ter sido uma conta bem alta, né? Porque lá é hospital top de linha. Mas por outro lado mostra que ele estava com doença grave.

Um dos ex-servidores falou que dava boa parte do dinheiro para o Queiroz, que aplicava o dinheiro. O senhor falou que todos tinham uma relação ali muito próxima. Ninguém nunca comentou isso?

Claro que não. O que as pessoas fazem entre si eu não tenho o direito de interferir. Se quiser dar o dinheiro para aplicar, o que eu tenho a ver com isso? Para mim, ele nunca propôs nada.

A maior parte desses servidores, que poderiam esclarecer o que acontecia ali, sumiu. Repórteres já tentaram encontrar, sem sucesso.

Que eu saiba todo mundo tem endereço fixo normal. Perdi o contato com todo mundo.

Por que o senhor decidiu falar agora?

Vejo que há grande intenção de alguns do Ministério Público de me sacanear, de mais uma vez me colocar em evidência coisas que não fiz. Estou preferindo me antecipar, porque meu processo corre em sigilo de Justiça, mas sempre que vai para o Ministério Público, os caras vazam tudo.

Mas, senador, não era de se esperar que o caso avançasse? O Judiciário está entendendo que o caso deve correr no Rio.

É de se esperar que se avançasse dentro da lei. Sou investigado há quase um ano e meio e, até ontem, o chefe do Ministério Público estava falando que eu não era investigado. Então, ele quer a verdade ou quer me prejudicar? É óbvio que tem de andar, sou a favor de qualquer investigação, sempre estive aberto para prestar quaisquer informações. Só que, a partir do momento que tomo conhecimento do que estão fazendo comigo… Quebraram meu sigilo bancário sem autorização da Justiça e expuseram isso em rede nacional. Como eu me defendo disso? Minha intimidade ninguém respeita? Minha chateação é com alguns pouquíssimos integrantes do Ministério Público que estão tentando atacar minha imagem para atacar o governo Jair Bolsonaro. Infelizmente, tem militância política em tudo quanto é instituição e no Ministério Público não é diferente.

Mas a Justiça está referendando o procedimento ao permitir que a investigação siga.

Pelo contrário, se estivesse tudo dentro da lei, não tinha problema nenhum. O Ministério Público está esculachando o Judiciário toda hora em meu caso e o Judiciário não faz nada.

O STF deixou seguir, o TJ do Rio deixou seguir, o PSL fez reclamação na Corregedoria e o caso foi arquivado.

É claro, o corporativismo existe lá também, né? Mas eu estou recorrendo para que o plenário vote abertamente e quero ver arquivar isso de público. Agora, o flagrante que ele tomou: o chefe do Ministério Público do Rio almoça com um jornalista e, na noite do mesmo dia, minha vida está exposta em rede nacional (refere-se à foto que circulou de um encontro entre o procurador-geral de Justiça Eduardo Gussem e o jornalista Otavio Guedes, da GloboNews). Não quero privilégio, mas não quero ser prejudicado porque sou filho do presidente. O Coaf pode ter acesso às movimentações financeiras de qualquer pessoa sem autorização judicial. Não pode compartilhar essas informações com o Ministério Público se for de forma tão específica, como foi meu caso.

Os bancos têm obrigação de notificar o Coaf e o Coaf, diante de movimentação atípica, tem de informar ao MP.

Sim. Mas, no meu caso, foi tão absurdo que o Ministério Público pedia por e-mail ao Coaf para que notificasse o banco e tivesse informações que nem o Coaf tinha. Por que tem de ter o controle jurisdicional? Para evitar a pirotecnia, essa perseguição que está acontecendo comigo.

O senhor já reclamou dos vazamentos, mas diz também que é algo fácil de explicar. Por que não abrir mão de seu sigilo fiscal e bancário e apresentar tudo?

Eu já fiz isso. Fui para a televisão e expliquei passo a passo. Está eternizado. Por que estão querendo agora pedir autorização para quebrar meu sigilo bancário se meu extrato já apareceu na televisão? Eles querem requentar uma informação que eles conseguiram de forma ilegal, inconstitucional. Como viram a cagada que fizeram, agora querem requentar, dar um verniz de legalidade naquilo que já está contaminado e não tem mais jeito. Não tem outro caminho para a investigação a não ser ela ser arquivada – e eles sabem disso. Por isso, o desespero de tentarem justificar e correm agora para requerer a quebra do meu sigilo bancário e fiscal.

O Coaf identificou movimentação que seria acima de sua renda. De onde vem a maior parte de seu dinheiro?

Não tem nada de atípico, porque não foi acima da minha renda. Vem de minha atividade parlamentar e da minha empresa.

Quanto dinheiro vem da franquia da Konpenhagen que o senhor detém?

Prefiro não falar, porque é meu patrimônio particular. Minha vida privada, não tem porque eu ficar falando aqui quanto ganho e deixo de ganhar. Declaro tudo para a Receita, nunca tive problema nenhum com o fisco. Estão querendo criar aura de que eu tenho uma relação com esse dinheiro que o Queiroz movimentava.

A franquia da loja começou em 2015. Mas, antes disso, o senhor já tinha montado boa parte de seu patrimônio.

Sim, arrisquei algumas vezes com compra de imóvel na planta, conseguia ganhar dinheiro com isso. Na época, o Rio de Janeiro deu um boom imobiliário. Tudo declarado.

Em 2012, o senhor compra dois imóveis de dois norte-americanos.

Já esclareci ao Ministério Publico. Me ofereceram três imóveis. Eu não tinha dinheiro e comprei só dois. São duas quitinetes de 29 metros quadrados, totalmente esculhambadas, sem garagem. Comprei pelo valor de mercado. Era um grupo de investidores que estava saindo do Brasil. Conheci por anúncio de jornal.

Eles vendem para o senhor por valor menor do que eles compraram.

Ué, eu consigo comprar mais barato e estou sendo julgado por isso? Eles estavam loucos para vender, eu estava com algum dinheiro para comprar e revender.

Um ano depois o senhor vende por R$ 400 mil a mais (Com os dois imóveis, lucra mais de R$ 800 mil em dois anos).

Foi um investimento. O Brasil estava na iminência de Olimpíada, esta é uma região que começava a valorizar. Totalmente compatível. Mais uma vez: querem criar uma fantasia onde, simplesmente, não tem. As oportunidades apareciam.

Na campanha, houve o caso da Walderice, funcionária do seu pai que vendia açaí em Angra. Veio Queiroz, com a filha que era personal trainer e trabalhava em academia.

Todas as pessoas trabalhavam em nossos gabinetes. É uma tentativa de querer rotular o nome Bolsonaro com algo ilegal. Não adianta, vão fuçar à vontade, e não tem nada.

O senhor empregou mulher e fila de um policial, acusado de integrar milícia. Qual sua relação com o ex-capitão da PM Adriano Magalhães da Nóbrega?

Conheci em 2003, 2004, mais ou menos. Ele estava sendo acusado de ter matado um trabalhador e, na verdade, era um traficante. Queiroz me apresentou. Resolvi abraçar aquela causa. Até homenageei ele depois como forma de mostrar que acreditava na palavra dele. Ele, agora, está sendo acusado de um monte de coisa. Se ele estiver errado, que a lei pese sobre ele. Como exigir de mim algo que 15 anos depois veio a tona?

Houve outras homenagens a policiais acusados de ligação com milícia. Um homenageado já tinha investigação de envolvimento em uma chacina.

Homenageei centenas de policias. Centenas. É humanamente impossível ficar puxando a ficha de todo mundo.

Não é banalizar a homenagem? Homenagear se você não sabe direito quem é?

Normalmente homenageava por uma situação especifica, quando efetuava prisão, apreensão importante. Policial sempre foi muito perseguido e sempre fiz esse contraponto.

O senhor falou que Queiroz encaminhava os nomes. Ele teve ligação com milícia?

Claro que não, né? Bem, que eu saiba, não. Só me falta mais essa: Queiroz miliciano. Ele sempre foi policial. Acredito que ele não soubesse (dos problemas dos homenageados). Ainda mais para me expor desse jeito.

O senhor hoje não defenderia miliciano?

Nunca defendi miliciano. Qualquer agente público que esteja à margem da lei tem de ser punido. Agora, lá atrás, quando se começou a discussão, qualquer prédio com três policiais era chamado de milícia. Eu dizia para não generalizar.

Congresso tirou Coaf de Sergio Moro. Concorda com o movimento?

Estava na mesa quando o Moro conversava com Jair recém-eleito presidente e pediu para levar o Coaf com ele. Jair falou: problema nenhum, é seu. Nunca tínhamos ouvido falar de Coaf na vida. Óbvio que esse relatório é uma derrota política para o governo. Ainda teremos a discussão em plenário. Meu voto é do governo.

O governo errou? É preciso ajustar a articulação política do governo?

Tem que melhorar, obviamente. Acho que é um recado. Alguns parlamentares têm de compreender que o presidente Bolsonaro está colocando em prática o projeto vitorioso nas urnas, está fazendo tudo o que ele prometeu.

O senhor tem que apagar incêndios criados por seu irmão Carlos?

Carlos coloca nas redes sociais a opinião dele, que nem sempre é a opinião do presidente ou a minha. Meu trabalho é fazer a ponte. Demandas legítimas eu ajudo a levar. Não busco apagar incêndio. Busco fazer meu trabalho da minha forma. Não sou de ir para internet lavar roupa suja. Gosto de trabalhar as coisas olhando no olho, conversando sem fazer alarde ou expor ninguém.

Já conversam em casa sobre isso?

Conversamos sempre. Carlos é vereador, tem mandato, tem opinião própria. Tenho preocupação de que, mesmo sabendo que a opinião do presidente Jair Bolsonaro pode ser diferente da do senador Flavio Bolsonaro, podem interpretar como o presidente avalizando. A postura do Carlos não pode ser interpretada como palavra do governo.

Devemos ignorar o que Carlos fala?

Dar menos importância. Potencializam demais. Claro que há interesse de alguns da mídia de criar intriga.

Olavo de Carvalho tem feito críticas ao ministro Santos Cruz.

A análise que faço de tudo é que é um embate de duas pessoas honestas, do bem, que querem o melhor para o Brasil, e cada um tem um jeito de se expressar. Debate de duas pessoas inteligentes.

Olavo tem feito acusações, insinuado que Santos Cruz tem ligação com negociatas.

Não pode ligar isso ao que o presidente Bolsonaro pensa. Olavo que tem de ser questionado sobre o que ele tem, para comprovar o que ele pensa.

Um dos pontos polêmicos do decreto de armas é a permissão para que crianças possam frequentar clubes de tiro. Vocês treinavam quando crianças?

Sim, desde crianças. É recomendável que pais possam fazer a apresentação aos filhos para evitar que a curiosidade de uma criança e o desconhecimento do que pode acontecer com uma arma de fogo levem a acidentes. Acho que é recomendável que pais levem os filhos a clube de tiro para evitar acidentes dentro de casa. O poder pátrio que deve prevalecer. Os pais sempre sabem o que é melhor para seus filhos.

Você anda armado? Ensina tiro a suas filhas?

Ainda não, mas pretendo. Tenho porte. É um instrumento de defesa, não sabemos quando o mal pode chegar perto da gente. É preciso deixar claro: a gente luta pelo direito à vida, pelo direito de não morrer. O estatuto de desarmamento já mostrou sua falência. O resultado da política de segurança pública e de direitos humanos que vem sendo praticada nas últimas décadas está aí: número cada vez maior de pessoas mortas por armas de fogo. Marginal só respeita o que ele tem medo.


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