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STF abre ação penal contra deputado do PP na Lava-Jato

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BRASÍLIA – O Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou nesta terça-feira denúncia contra o deputado Nelson Meurer (PP-PR) e seus dois filhos, Nelson Meurer Junior e Cristiano Augusto Meurer, e abriu ação penal contra eles. Os três agora são réus e responderão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A decisão foi tomada por unanimidade pela Segunda Turma do tribunal, formada por cinco ministros. É a segunda ação penal aberta no STF no âmbito da Lava-Jato. Antes disso, apenas o presidente afastado da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), era réu no tribunal por conta dos desvios da Petrobras.

As investigações revelam que o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e a cúpula do PP receberam, entre 2006 e 2014, R$ 357,9 milhões em recursos desviados de contratos de empreiteiras com a estatal. Desse total, R$ 62,1 milhões eram guardados em um “caixa de propinas” administrado pelo doleiro Alberto Youssef. Um dos maiores beneficiados com o esquema de desvios foi Meurer. No período, ele recebeu R$ 29,7 milhões. A quantia foi dividida em 99 repasses de R$ 300 mil mensais.

Segundo a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Meurer também obteve, em 2010, “repasses extraordinários” para financiar sua campanha à reeleição na Câmara dos Deputados. Por meio de Youssef, teriam sido entregues R$ 4 milhões em espécie ao deputado. Além disso, a construtora Queiroz Galvão transferiu R$ 500 mil a Meurer em dois repasses. Para a Procuradoria Geral da República, tratava-se de “propina disfarçada de doação eleitoral oficial”.

A PGR afirma que a propina paga correspondia a 1% do valor total do contrato da empresa com a Petrobras. O total da propina era fatiado da seguinte forma: 60% eram destinados ao PP; 20% eram divididos entre Paulo Roberto, o ex-deputado Roberto Janene, já falecido, e Youssef; e os outros 20% eram usados para custos operacionais, como a emissão de notas fiscais.

Os dois filhos do deputado teriam contribuído para o recebimento do dinheiro e, por isso, também foram denunciados. Janot pediu que os três devolvessem aos cofres públicos os R$ 357,9 milhões desviados. Ele também quer que o grupo pague danos morais à União no mesmo valor, no mínimo. As cifras seriam acrescidas de juros e correção monetária. Esse pedido será julgado ao fim da ação penal, se os crimes forem comprovados.

Conforme a denúncia, o Nelson Meurer cometeu corrupção passiva por 161 vezes e lavagem de dinheiro, por 180 vezes. Os pagamentos seriam uma espécie de remuneração ao deputado e à cúpula do PP pelo apoio à nomeação de Costa para a Diretoria de Abastecimento da Petrobras. As empreiteiras concordavam em custear a propina para garantir a continuidade do cartel de empresas selecionadas para celebrar contratos irregulares com a Petrobras.

Ainda de acordo com o procurador-geral, Meurer tinha várias estratégias para ocultar o dinheiro. Uma delas era receber grandes quantias em espécie. Ele também recebia dinheiro por meio do Posto da Torre, do doleiro Carlos Habib Chater, primeiro alvo da Operação Lava-Jato. O deputado também realizava depósitos em suas contas bancárias de valores menores, para se esquivar do rastreamento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Meurer ainda declarava no Imposto de Renda alta quantia em espécie, para tentar conferir à propina o caráter de licitude.

MOVIMENTAÇÃO INCOMPATÍVEL

No voto, o relator do processo, ministro Teori Zavascki, afirmou que a vasta movimentação bancária do deputado é incompatível com a quantia declarada oficialmente por ele. À Receita Federal, Meurer afirmou que tinha apenas duas fontes de renda: o salário de deputado e uma aposentadoria do INSS. Teori rebateu o argumento da defesa de que a denúncia não fez a descrição pormenorizada dos crimes atribuídos a cada um dos investigados.

— A peça acusatória, de forma muito clara, descreve os eventos e atribui a autoria de forma muito clara. Há indícios concretos do recebimento de valores por parte do deputado Nelson Meurer, pela particular movimentação financeira detalhada no relatório — concluiu o relator.

Ao fim do julgamento, o presidente da Segunda Turma do STF, ministro Gilmar Mendes, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), fez discurso irônico criticando o que chamou de “capitalismo de partido”, um sistema em que se funde o dinheiro do estado e o do partido.

— Quando se fala em propina avençada em forma de doação, o TSE passa a ser um lócus de lavagem de dinheiro, com dificuldade de distinguir a doação legal, normal, desse tipo de doação. O dinheiro retirado do Estado para o partido não é corrupção, mas o dinheiro retirado para si próprio é corrupção? Isso faz parte do discurso de determinadas agremiações. De onde se extraiu essa pérola? Como distinguir uma e outra situação? — questionou Gilmar.

O subprocurador-geral da República Odim Brandão, que acompanhou o julgamento, também criticou a fusão entre o público e o provado na política. Ele comparou o esquema desvendado na Operação Lava-Jato com o escândalo do mensalão, julgado e condenado pelo STF em 2012.

— O ponto central aqui é a confusão de patrimônio privado com o poder político no país. A estrutura concreta do problema que tem a ver com a estrutura já condenada pelo STF na Ação Penal 470 (mensalão) — declarou.

Antes da votação, o advogado Alexandre Jobim, contratado para defender o deputado, disse que a denúncia atribui a seu cliente um protagonismo no PP que ele nunca teve. Segundo Jobim, Meurer foi líder do partido apenas por seis meses, de fevereiro a agosto de 2011. Por isso, ele não poderia ser responsabilizado por toda a propina recebida pela legenda.

— O STF não pode aceitar a abertura de uma ação penal por mera presunção. É inadmissível —reclamou Jobim.

Segundo o advogado, Meurer recebeu apenas “um ou dois depósitos de R$ 40 mil” em sua conta. O dinheiro seria referente a repasses de Janene a título de apoio financeiro para campanha eleitoral. Jobim disse que o deputado não sabia que o dinheiro vinha do Posto da Torre, como ficou comprovado nas investigações.


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