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Sem armas não-letais, governo de SP adia reintegração em escola

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SÃO PAULO – Com dois horários possíveis marcados, às 10h e às 14h, a reintegração do Centro Paula Souza, escola ocupada por estudantes em São Paulo há uma semana, não acontecerá até que a Justiça retire a proibição do uso de armas, inclusive não-letais, como bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha, pelos policiais. A Secretaria de Segurança Pública afirma que a ação está mantida, mas só será cumprida quando forem afastadas duas condições colocadas pelo juiz Luis Manuel Fonseca Pires, do Tribunal de Justiça de São Paulo: a proibição do uso de armas, letais ou não, e a presença do secretário de Segurança Pública Alexandre de Moraes no local. A secretaria classificou as condições de abusivas e ilegais. Em nota, disse que o estabelecimento desses requisitos “pode gerar riscos no momento de retirada dos invasores”.

“A análise sobre a necessidade ou não de porte de armas, inclusive não letais, deve ser feita pela Polícia MIlitar, para garantir a integridade dos próprios manifestantes, como forma de mitigar atos mais enérgicos ou que possam ocasionar maior dano às pessoas”, comunicou a secretaria. Para a secretaria, o comando da operação também não pode ser retirado da hierarquia da Polícia Militar e atribuído ao secretário de Segurança Pública. A Procuradoria-Geral do Estado tentará afastar as condições definidas pela decisão do Tribunal de Justiça.

A decisão judicial ocorreu após uma reunião entre representantes dos estudantes e do governo estadual, que não chegaram a um acordo. Na segunda-feira, a Polícia Militar invadiu o prédio após uma decisão da 14ª Vara da Fazenda Pública da capital, mas, como o mandado não havia sido expedido pelo Tribunal de Justiça, uma decisão do tribunal suspendeu a ação policial e pediu esclarecimentos do secretário de Segurança Pública para a invasão.

Dentro do Centro Paula Souza, estudantes comemoraram cantando uma versão de “Marcha, Soldado”.

O corretor de imóveis Luiz Braga está desde cedo em frente ao Centro Paula Souza. O filho dele, de 17 anos, estudante de uma Etec, participa da ocupação no local e ele, embora apoie o movimento, teme violência policial durante a reintegração de posse.

— Apoio a luta por educação. Quando chega num protesto como esse é sinal de que a educação falhou. Temo a violência sim. Não podemos exigir da polícia que sente e dialogue com eles porque essa nem é a função dela.

Braga diz que a unidade em que o filho estuda sofre com falta de infraestrutura e merenda. Ele conta que o lanche passou a ser servido apenas a partir desta segunda-feira, após as ocupações.

— Antes dos protestos, não tinha. Agora passou a ter merenda seca, pouco nutritiva. Os meninos não estão pedindo filé mignon, mas arroz e feijão. É pedir demais? — questiona.

ESTUDANTES TAMBÉM OCUPAM ALESP

Os estudantes fizeram um ato nesta manhã e, em jogral, disseram que vão permanecer na escola. Na Assembleia Legislativa (Alesp), outro grupo de estudantes que ocupam o plenário também prometeram ficar até a instalação de uma CPI para investigar a Máfia da Merenda. Quando souberam do afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, comemoraram.

Para instaurar a CPI, são necessárias 32 assinaturas – os defensores da proposta tem 25. No entanto, mesmo que o número seja alcançado, a instauração só ocorreria após uma das CPIs já em curso na Alesp termine: é permitido o funcionamento de apenas cinco CPI de forma concomitante.

Uma das alternativas encontradas pelo deputado é tirar a CPI da Eletropaulo da pauta. Um parlamentar que preferiu não se identificar afirmou que as sete assinaturas que faltam para a instalação de uma investigação da chamada Máfia da Merenda sairão e será acelerada com a troca.

– Vai sair, vamos conseguir essas assinaturas, mas tá tudo parado aqui. Eles precisam desocupar – explicou ele, referindo-se aos estudantes que ocupam a Alesp.

Em entrevista à ‘BBC Brasil’, o presidente da Alesp Fernando Capez (PSDB), investigado no escândalo da máfia da merenda, diz que é favorável à abertura da CPI. Por outro lado, foi reticente sobre sua capacidade de ter resultado. Capez assinou o pedido mas, por ser presidente, sua assinatura não conta.

“Agora eu tenho todo interesse na CPI porque a minha investigação está andando a passos lentos e eu tenho interesse em produzir provas. Mas você já viu CPI dar em alguma coisa? CPI apurar alguma coisa? Fizemos uma CPI aqui dos pedágios, não deu nada”, disse.

Durante o dia, os alunos que ocupam a Alesp ganharam a solidariedade de outros, que estão agora estão acampados do lado de fora. Após proibir a entrada de alimentos, Fernando Capez voltou atrás da decisão; agora, estão sendo fornecidos lanches aos estudantes.

Na manhã desta quinta-feira, uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo deu 24 horas para os alunos saírem da Alesp — sob pena de terem que pagar uma multa diária de R$ 30 mil por ocupante. Segundo os alunos, há cerca de 80 deles no interior do plenário.

OAB: “FORÇA POLICIAL AINDA NÃO ESTÁ REQUISITADA” PARA REINTEGRAÇÃO

A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo de dar um prazo de 24h para os estudantes deixarem a Assembleia Legislativa de São Paulo, ocupada desde a noite de terça-feira, deixou o grupo que pede instalação da CPI da Máfia da Merenda apreensivo. Eles temem ação agressiva da Polícia Militar, mas advogado da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que auxilia os jovens garantiu que está sendo tudo encaminhado “com muita calma”. Para ele, levará mais de 24h para acionar a PM.

– Mesmo a reintegração não sendo possível, o juiz determinará audiência de conciliação, e só depois lançará mão da força policial – explicou Victor Henrique Grampa, presidente da Comissão de Direito Educacional e Política Pública na Educação da OAB-SP.

– O juiz diversas vezes recomendou que sejam tomadas todas as precauções possíveis, garantindo a integridade dos menores, dos ocupantes. A força policial ainda não está requisitada para essa ação. Primeiro comunica-se a decisão, depois se abre prazo para cumprimento voluntário e só depois lança-se mão da força policial. Com certeza não será no prazo de 24h – apontou Grampa.

De licença médica, Cláudia Rodrigues está ocupando o plenário da Casa junto com a filha. Ela auxilia na entrega de comidas, cobertores e materiais de higiene doados por simpatizantes do movimento e políticos. Apesar da determinação da Justiça, que ainda não tinha chegado na Alesp até as 15h desta quinta-feira, ela frisa que o grupo só sairá com a abertura da CPI.

Aparentemente cansada, Cláudia diz que o grupo está conseguindo manter a ordem na Casa. As meninas ganharam das faxineiras alguns baldes para banho. Como os estudantes só têm acesso a um banheiro, a água vem direto de uma torneira.

– Não tem água quente, então algumas só têm coragem de tomar banho. Outras fazem a higiene básica – explica ela, achando graça

(*Estagiário, sob supervisão de Flávio Freire)


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