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Lava-Jato completa dois anos com impacto nos sistemas político e judiciário

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CURITIBA e são Paulo A Operação Lava-Jato completa dois anos na próxima quinta-feira causando impactos no sistema político e judiciário do país. Após as revelações da existência de um esquema de corrupção montado na Petrobras para abastecer os caixas de partidos, o Congresso, pressionado, transformou o financiamento eleitoral privado em crime. A operação iniciada com a prisão do doleiro Alberto Youssef em 17 de março de 2014 levou à condenação de mais de 60 pessoas entre políticos e donos das maiores construtoras do país. Apesar disso, nas últimas semanas a Lava-Jato passou a ser alvo de ataques nas ruas pela primeira vez, após a ação contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

— A Lava-Jato é preciosa demais para ser transformada em alvo de uma disputa política. Uma investigação dessa envergadura, que explicitou com números alarmantes a dimensão da corrupção no país, não pode ficar à mercê de grupos políticos. É um risco e um equívoco — afirma Wagner de Melo Romão, chefe do Departamento de Ciência Política da Unicamp.

Em dois anos, foram instaurados 1.114 procedimentos investigativos que levaram a 39 ações na Justiça Federal do Paraná. Em 24 fases, a Política Federal cumpriu 133 mandados de prisão contra políticos, operadores, empresários e agentes públicos. Foram feitas 482 buscas e apreensões e 117 pessoas foram levadas coercitivamente para depôr — entre elas Lula.

A certeza da condenação levou a assinatura de 49 delações premiadas por envolvidos no esquema, e cinco empresas admitiram crimes e aderiram a acordos de leniência.

Na semana passada, o juiz Sérgio Moro evitou politizar a operação em palestra a mais de 3 mil pessoas num seminário em Curitiba. Ele disse que o maior legado da Lava-Jato é fortalecer as instituições.

Além do fim do financiamento de empresas às campanhas, uma das conquistas atribuídas à Lava-Jato é a mudança no entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o cumprimento de pena após a condenação em segunda instância. Agora, se a condenação for mantida na Corte, o réu passa a cumprir prisão imediatamente.

Não só de conquistas a Lava-Jato viveu nesses dois anos. O caráter abrangente das investigações sobre a corrupção, que desde o início sinalizou ir além da Petrobras, provocou reações contrárias, que vão da tentativa de acordão de empreiteiras, logo no início da operação em novembro de 2014, ao sancionamento da Medida Provisória 703, que flexibilizou as regras do acordo de leniência ao permitir que mais de uma empresa seja beneficiada.

advogados criminalistas fazem críticas

Na contramão das apurações, os parlamentares não aprovaram leis tornando mais rígido o combate à corrupção e, sequer, discutiram a possibilidade de limitar o foro privilegiado, diminuindo as chances de que seja usado para garantir impunidade.

A Lava-Jato está longe de ser unanimidade no meio jurídico. Enquanto associações ligadas à magistratura e a investigadores comemoram o combate à corrupção, do outro lado do balcão, advogados criminalistas criticam o excesso de medidas de força, como conduções coercitivas e prisões preventivas. Os defensores brigam para que o processo não fique só em Curitiba e reclamam da exploração midiática de suspeitos, o que, segundo os defensores, faz com que eles sejam condenados previamente.

— Há uma banalização do uso de força. Nossa lei prevê que a prisão deveria ser uma exceção. Na Lava-Jato, é uma regra — afirma o advogado Augusto de Arruda Botelho, presidente do Instituto de Defesa do Direito da Defesa (IDDD) e defensor de alguns executivos da Odebrecht.

Sem citar seus clientes, Botelho defende uma opinião corrente entre alguns advogados: de que as prisões preventivas funcionam como forma de forçar o investigado a assinar um acordo de delação premiada. O advogado diz que o encarceramento de suspeitos antes do julgamento já é uma prática corrente na Justiça brasileira. Na opinião dele, ao ver essa medida sendo adotada na Lava-Jato, juízes de primeira instância podem abusar ainda mais dela.

Seguindo o raciocínio de Botelho, advogados ouvidos pelo GLOBO afirmam que o “clima de punição” gerado pela operação influenciou a decisão do STF que determina que um condenado em segunda instância cumpra pena automaticamente.

Já o criminalista Rogério Taffarello, do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) critica o excesso de medidas midiáticas, como a convocação de entrevistas coletivas a cada operação e a exposição de suspeitos para que a opinião pública forme seus julgamentos. Taffarello também atua no processo, defendendo um dos operados e um dos sócios do grupo Schahin.

— O que a lei diz é que ninguém deverá ser tratado como culpado. Essa operação tornou normal algo que só acontecia às vezes: os advogados ficarem sabendo por sites coisas que aconteceram no processo. É algo a lamentar.

Embora os advogados reclamem, foram poucas as decisões de Moro revistas nas instâncias superiores. Até agora só uma condenação foi revertida no TRF-4, a segunda instância da Justiça Federal. Foram soltos André Catão de Miranda e Maria Penasso, ligados ao posto que deu nome à operação. O STF reviu 11 decisões, que envolvem habeas corpus e o fatiamento da operação.


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