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“Entrar num lugar e saber que está faltando alguma coisa”, diz esposa do motorista Anderson

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Brasil – Nas últimas horas de vida de Anderson Pedro Gomes, Agatha Arnaus Reis trocou mensagens esperançosas com o marido sobre um exame médico do filho Arthur, cujos resultados ela buscava interpretar com a ajuda da internet antes da próxima consulta com o endocrinologista.

Anderson não sobreviveu para ouvir a boa notícia que esperava desde o nascimento da criança. Dias após a morte de Anderson, Agatha soube que o atraso no desenvolvimento do filho, de 1 ano e 10 meses – que nasceu prematuro – era provocado pela defasagem de um hormônio e teria solução razoavelmente simples, com injeções hormonais uma vez por mês.

“Depois da barra pesada que passamos com o Arthur, é muito difícil ver que o pai que passou por tanta dificuldade não vai conseguir ver o desenvolvimento do filho, agora que ele vai entrar numa fase mais divertida”, lamenta Agatha, viúva aos 27 anos.

Quando nasceu, Arthur passou 28 dias no hospital. “Falaram que ele tinha uma síndrome e ia ser cego e surdo. Foram momentos de muito medo”, conta Agatha. O filho passou por três cirurgias para corrigir uma má-formação no abdômen e quatro exames genéticos.

“Ele era a pessoa mais maravilhosa que eu conheci na vida”, diz. “Um marido maravilhoso, um pai maravilhoso. Brincando com o Arthur, eles pareciam duas crianças.”

Longe de casa

Desde a morte do marido, ela ainda não teve coragem de voltar para casa. De lá pegou roupas e documentos e se hospedou na casa da mãe, em Inhaúma, zona norte do Rio.

“É uma das sensações mais estranhas que eu já tive. Entrar num lugar que era pura alegria e saber que está faltando alguma coisa. Acho que vou sentir isso para sempre ali.” Os dois eram casados há quase quatro anos.

Anderson e Agatha foram apresentados por um amigo em comum. Depois, ele ligou para ela com uma desculpa de que tinha esbarrado no nome dela sem querer no telefone, afinal os nomes com a letra “A” ficam no topo da agenda. As conversas evoluíram para um namoro e, mais tarde, para o pedido de casamento.

O grito “Marielle, presente! Anderson, presente!” vem ecoando em protestos, homenagens e eventos realizados no Rio e em outras partes do país, sempre evocando a vereadora e o motorista. Agatha diz se sentir consolada por ver que o marido é sempre lembrado.

“Eu sei que a Marielle tem uma visibilidade muito maior por ter sido vereadora. Mas em outros casos eu acredito que o motorista teria ficado apagado”, afirma.

“Acho que isso também aconteceu porque o Anderson era muito comunicativo. Falava com todo mundo, não tinha uma pessoa que não conhecesse ele. Mesmo sendo só o motorista. O fato de ele estar tendo essa visibilidade é a continuação da pessoa que ele era, expansivo, comunicativo.”

Anderson tinha experiência como motorista executivo e chegou a trabalhar com aplicativos de transporte. Por isso, quando um amigo que dirigia o veículo de Marielle se acidentou e quebrou a clavícula, indicou Anderson para substituí-lo em sua licença médica.

Ele sabia que o posto era temporário e semanas antes de morrer, estava entusiasmado com a perspectiva de arrumar um emprego fixo como mecânico de aeronaves, profissão que herdou do pai, um ex-funcionário da Varig.

Os pais de Anderson eram da Paraíba e vieram ao Rio em busca de emprego. Anderson, o segundo dos quatro filhos do casal, foi o primeiro carioca nato da família, e era torcedor do Flamengo.

Servidora pública, Agatha trabalha em um Ciep (escola estadual) em Inhaúma e não sabe ainda como vai fechar as contas no fim do mês. O casal dividia todos os gastos da casa e dos tratamentos do filho.

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Ela diz ter ficado comovida ao saber da criação da campanha “Ajude a família de Anderson Pedro Gomes”. A página do crowdfunding foi estabelecida pelo gerente comercial Rhavi Pinta e pede contribuições para ajudar na criação de Arthur. “Ajude uma família cujo o estado fez o favor de destruir”, diz a página, que até agora conseguiu arrecadar R$ 15 mil.

Agatha espera que as manifestações, e cobranças de respostas, ajudem a evitar que a história se repita. Acredita que o crime tenha sido político, e que a vítima escolhida era Marielle. Confia que os responsáveis pelo assassinato serão encontrados.

Fonte: BBC Brasil


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