Artigo: Procultura, um passo adiante
A diversidade cultural é uma das nossas principais identificações como brasileiros. É um ativo social e econômico incalculável. Zelar por ela é papel do Estado, assim como garantir a todos os brasileiros o direito de ter meios de produzir e de ter acesso a esse patrimônio.
A cultura traz desafios imensos às políticas públicas. É constituída de dimensões variadas, de iniciativas experimentais de pequeno porte a fenômenos de massa que movem mercados vigorosos. Nessa dinâmica, coexistem temas como diversidade cultural, liberdade de expressão, preferências estéticas e mercados especializados, entre diversos outros. Um sistema público de fomento deve dialogar com essa multiplicidade, criando um ambiente propício para todos. A preocupação com a dimensão simbólica da cultura e com a democratização do acesso deve ser harmonizada com a criação de condições para o desenvolvimento da economia da cultura.
A Lei Rouanet demonstrou ser incapaz de dar conta desse desafio, contemplando apenas parte do universo complexo da cultura. Em sua aplicação, a Rouanet privilegiou de maneira muito evidente o mecanismo de incentivo fiscal à cultura, que é uma prática legítima, mas que não pode ser a única opção potente. Um exemplo dessa limitação é a desigualdade regional. Por exemplo: tudo que o Norte e o Nordeste captaram em 24 anos equivale à captação do Sudeste apenas em 2015.
É urgente um novo marco regulatório para a política nacional de fomento à cultura. O projeto de lei denominado Procultura preserva mecanismos já existentes na Rouanet, aperfeiçoando-os, e abre novas formas de financiamento. Garante um equilíbrio entre os diversos mecanismos e incorpora temas fundamentais como sustentabilidade (constituição de endowments), dinamização de mercado (linhas de investimento, crédito e constituição real de fundos de investimento) e integração federativa (repasse fundo a fundo).
Também inova ao dar mais estímulo à participação de pessoas físicas no financiamento à cultura, ao racionalizar prestação de contas, ao fortalecer ações afirmativas, ao diferenciar apoio a projetos pontuais de apoio a atividades continuadas, como manutenção de grupos e espaços culturais. Tudo isso mantendo o incentivo fiscal como indutor de atração de recursos para a cultura.
O receio das mudanças por vezes não observa experiência bem-sucedida em outros setores ou em nível local. O ajuste do teto de renúncia do patrocínio de 100% para 80% funciona bem em diversos estados brasileiros e de fato traz novos recursos para a cultura. Estados que implantaram o fundo de cultura junto com leis de incentivo incorporaram dinâmicas culturais à margem do mercado. Grande parte do sucesso da atual política audiovisual está lastreada no Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). A modalidade “investimento” tem bons resultados no cinema e na área de inovação tecnológica.
Para cada avanço, naturalmente, novos desafios virão. Só existirão porque teremos mais opções, mais oportunidades. Aqui a decisão é por uma política de fomento à altura da cultura do Brasil. Nada menos.
* Carlos Paiva é secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC