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Cresce debate sobre status econômico chinês

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RIO – Quase 15 anos após a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC) — considerada um marco da ascensão do país asiático no cenário internacional —, novamente o debate sobre a China ser ou não uma economia de mercado volta ao centro das atenções. Com o reconhecimento, seria mais difícil questionar práticas do país asiático na OMC.

A indústria siderúrgica é uma das que mais tem lutado contra a possibilidade de reconhecimento desse status, especialmente pela União Europeia (UE). O setor reclama da invasão do aço chinês e chegou a organizar uma manifestação em Bruxelas, em fevereiro. A Comissão Europeia, braço executivo da UE, ainda não tomou uma decisão. Recentemente, a comissária europeia para o comércio, Cecilia Malmström, afirmou que a discussão sobre o reconhecimento da China como economia de mercado não muda a necessidade de o país asiático lidar com o excesso de produção de aço que “invade os mercados”.

Pelas regras do processo de adesão da China à OMC, o país teria 15 anos para se adaptar, até dezembro de 2016, para ganhar status de economia de mercado. Há quem diga que, após esse prazo, a China ganhará automaticamente esse status — a própria China defende isso —, mas outros, como entidades empresariais em Estados Unidos, UE e Brasil, argumentam que o processo não é automático. Caso a China consiga o status, será mais difícil para outros países questionarem suas práticas na OMC.

CAUTELA DO GOVERNO BRASILEIRO

Oficialmente, os países não têm se pronunciado publicamente sobre o assunto. Relatos na mídia europeia apontam que a Comissão Europeia tem se mostrado simpática ao reconhecimento do status. A chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou, durante visita à China, que a princípio é a favor da concessão do status de economia de mercado, mas que ainda havia trabalho a ser feito. Já os EUA são menos favoráveis, alertando para os riscos da menor possibilidade de se defenderem de uma invasão de produtos chineses baratos. Mas especialistas alertam que a China deve recorrer ao Órgão de Solução de Controvérsias da OMC se não tiver esse status reconhecido.

No Brasil, o Itamaraty afirma que ainda estuda a questão, buscando informações sobre o posicionamento de outros países.

— É um tema que deve acabar em controvérsia. Então (o Brasil) precisa ter uma posição sólida, bem argumentada, porque vai ter que sustentar essa argumentação no órgão de apelação e no painel depois — disse o subsecretário-geral de Assuntos Econômicos do ministério, Carlos Márcio Cozendey.

Em um processo de investigação de concorrência desleal nas vendas de um país para outro, compara-se o preço do produto exportado com o valor do mesmo item praticado internamente no país exportador. O documento de adesão da China tem artigo que prevê o uso de preços de um terceiro local. Isso porque os preços no país têm influência de fatores além do mercado, como subsídios ao crédito. É esse artigo que deixa de valer em dezembro deste ano.

— A China entende que, considere ou não que ela é economia de mercado, em dezembro não pode usar mais o método alternativo. Outras interpretações dizem que não, que só elimina o artigo, mas não elimina os métodos alternativos — explicou Cozendey.

Se o governo mostra cautela, o empresariado brasileiro já se mobilizou. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) encomendou um estudo detalhado sobre o assunto em 2013. Sócio do escritório de advocacia Campos Fialho e responsável pelo estudo, Lucas Spadano afirma que o texto da OMC é ambíguo, mas que não determina o reconhecimento obrigatório da China como economia de mercado:

— Nossa interpretação é que ocorre a inversão do ônus da prova. Se hoje se parte do princípio que a China não é uma economia de mercado, depois será preciso uma constatação prévia, com base na legislação brasileira.

Sua avaliação é que, embora a base jurídica seja forte, a decisão dos países deve ser política. A China, por sua vez, monitora a decisão dos demais países.

— A China concordou com uma série de compromissos, porque esperava o reconhecimento automático do status de economia de mercado até dezembro de 2016. Se a posição dos países for diferente, é muito provável que a China inicie um contencioso — disse Pablo Bentes, diretor de Comércio Internacional e Investimento do escritório internacional de direito Steptoe & Johnson LLP, que defendeu a China em dois casos junto à OMC.

FIESP: DISCUSSÃO PRAGMÁTICA

CNI e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ressaltam a importância da China como parceiro comercial do Brasil, mas argumentam que o país não é economia de mercado e, por isso, não pode ser tratado como tal.

— A China é um grande parceiro do Brasil, e este é um tema delicado. Mas, pelo que se constata, a China não tem câmbio livre, as empresas têm participação estatal e há um grau de controle sobre elas — disse o diretor da CNI Carlos Eduardo Abijaodi.

Diretor de Relação Internacionais e Comercio Exterior da Fiesp, Thomaz Zanotto reconhece a relevância da China para o Brasil. Mas defende uma discussão pragmática:

— A China é nosso principal parceiro comercial, mas não é uma economia de mercado. O assunto deve ser tratado de forma pragmática e sem receios.


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