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Segurança no fio da navalha

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RIO — O plano da Secretaria de Segurança de cortar este ano 32% de seu orçamento de R$ 7 bilhões, em decorrência da grave crise financeira que o estado atravessa, poderá afetar serviços essenciais à população do Rio e, inclusive, o esquema de segurança das Olimpíadas. Estão ameaçados o atendimento do serviço 190 e a transmissão de imagens das 500 câmeras instaladas em pontos estratégicos do estado e em 1.500 veículos da Polícia Militar. Também serão atingidos o avanço do projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), além do pagamento do Regime Adicional de Serviço (RAS) aos policiais que vão reforçar, fora de seus horários de serviço, o efetivo que trabalhará durante os Jogos. As dificuldades foram discutidas na última quinta-feira pelo Secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, e o e o secretário de Estado da Casa Civil, Leonardo Espíndola. Na conversa, Beltrame chegou a dizer que “não tem mais de onde cortar”.

Beltrame: A gente não trabalha com gordura

Na planilha enviada à Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag), e ainda não aprovada, a pasta prevê enxugar os contratos com as empresas Oi, responsável pela Central 190, e com a Embratel, que cuida da transmissão e armazenamento das imagens captadas nas ruas do Rio e das viaturas da PM. A Secretaria de Segurança não informou ao GLOBO o valor dos contratos, mas eles representam 80% das despesas com prestadores de serviço. Dados do Portal da Transparência, da Secretaria de Fazenda, mostram que, em outubro do ano passado, o órgão teve com a Oi uma despesa de R$ 3,6 milhões.

Ainda não está definido exatamente como os cortes serão feitos, mas ao ser perguntado anteontem se eles vão interferir no atendimento pelo 190, o canal de ligação entre a população e a PM que recebe em média 7 mil ligações diárias de toda a Região Metropolitana, Beltrame foi taxativo:

— Claro que vão, não tem como dizer que não vão. Se eu te disser que cortar 1% vai prejudicar, vai. Por quê? Porque a gente trabalha sempre, tecnicamente, em cima do fio da navalha. A gente não trabalha com gordura. Não é só o 190, vai prejudicar o serviço da segurança pública como um todo, não tenha dúvida disso. Seria uma leviandade dizer outra coisa. É o mesmo que perguntar se a retirada de 10% do seu salário vai alterar a sua rotina. Claro que vai.

O sistema 190 é terceirizado, mas dirigido por um oficial da PM, e funciona no prédio do Centro Integrado de Comando e Controle da Secretaria de Segurança (CICC), na Praça Onze. No local, há atendentes que falam inglês e espanhol. A Oi é responsável por montar a estrutura para o recebimento das chamadas do sistema no CICC e no prédio da sede da secretaria, na Central do Brasil, onde há o armazenamento das ligações (backup). Pelo contrato com a empresa, o Estado pode rescindir apenas 25% do pactuado, unilateralmente. O restante precisa ser discutido entre as duas partes, o que já vem sendo feito:

— É um assunto que o governador (Luiz Fernando Pezão) e a Fazenda (Secretaria de Estado) estão conversando e renegociando com as empresas. Essa é a demanda que a gente passou, que eles procurem uma renegociação, pagar um pedaço, para que a gente possa dar continuidade, porque o serviço ainda não foi interrompido. Mas há necessidade de se pagar — disse Beltrame.

Ainda não ficou estabelecido como os cortes atingirão o serviço de transmissão de imagens feito pela Embratel e o 190, mas uma das hipóteses, no caso do canal de atendimento telefônico, é acabar com a terceirização dos funcionários. Foi cogitado que as ligações passassem a ser atendidas por policiais, como já ocorreu no passado. Esta solução, no entanto, teria reflexo nas ruas, com a redução de efetivo. Procuradas, a Oi não quiseram dar declarações. A Embratel alegou sigilo dos contratos.

Expansão de Projeto pacificador parada

Em tempo de vacas magras, o pagamento do Regime Adicional de Serviço (RAS) — gratificação extra oferecida aos policiais que complementam o efetivo fora do horário de trabalho regular — está ameaçado durante as Olimpíadas. Na última sexta-feira, durante visita do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao Rio, para discutir o planejamento da segurança dos Jogos com Beltrame, o assunto chegou a ser abordado. Segundo uma fonte presente à reunião, o governo federal demonstrou preocupação com a possibilidade de redução do número de policiais no evento. Como é o agente que se oferece voluntariamente para o trabalho extra, diante da ameaça de não receberem, a maior parte optou por não se cadastrar. Até agora, apenas 10% do efetivo da PM e da Polícia Civil, se interessou por fazer horas extra durante os Jogos.

As Unidades de Polícia Pacificadora também sofrerão consequências diretas dos cortes do Estado. Aos colaboradores diretos, Beltrame confidenciou que não tem como investir nada na ampliação do projeto, que conta com 38 unidades e está estagnado desde março de 2014. O planejamento inicial da secretaria, que previa a instalação de uma UPP no Complexo do Chapadão, em Costa Barros, não sairá do papel. A estratégia será realocar parte da doação de R$ 70 milhões da Assembleia Legislativa (Alerj), destinada principalmente à construção de UPPs e à reforma do centro de formação da PM, para investir nas unidades consideradas mais violentas. No próximo mês, está prevista a substituição dos contêineres onde funcionam as UPPs da Rocinha; dos Prazeres, em Santa Teresa; e Chatuba, no Complexo do Alemão, por instalações de alvenaria.

A ideia de construir duas unidades de concreto no Complexo da Maré, apesar de elas estarem previstas na planilha da Alerj, também será adiada, justamente para aplicar a verba em áreas onde o projeto está mais consolidado. Beltrame ainda espera reverter a situação, pois a Maré é uma região estratégica. Não só é uma das áreas mais violentas, mas está encravada entre três vias importantes na passagem da comitiva dos Jogos Olímpicos na chegada ao Rio: a Avenida Brasil e as Linhas Vermelha e Amarela.

Planejamento diz que não fez cortes

Por meio de nota, a Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) informou que não houve corte do orçamento da Segurança. Segundo o órgão, os ajustes realizados até agora foram feitos apenas na folha de pagamento. A Secretaria de Segurança costuma receber o dinheiro destinado ao pagamento dos servidores em uma única cota anual, mas, agora, a Seplag depositou os valores referentes somente aos primeiros quatro meses do ano.

O Orçamento de R$ 7 bilhões da Secretaria de Segurança contempla, além da PM e da Polícia Civil, o Corpo de Bombeiros e a Secretaria de Administração Penitenciária, que também sofrerão cortes. Também estão na rubrica de Beltrame autarquias como o Instituto de Segurança Pública (ISP), o Centro Integrado de Controle e Comando (CICC) e a Corregedoria Geral Unificada.


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