Brasília Amapá |
Manaus

Animais chegam ao Rio durante o inverno em busca de temperatura mais amena

Compartilhe

RIO — Os 8,6 graus registrados antes mesmo da chegada do inverno foram a desculpa perfeita que os cariocas precisavam. Não se pode brigar com o termômetro, faz frio, sim, no Rio, e não se fala mais nisso. A verdade é que esse friozinho é coisa rara, culpa de uma massa de ar polar. Basta lembrar dos invernos anteriores que de gélidos não tiveram quase nada, aliás, um clima ameno para quem não mora no Rio, mas considerado frio demais pela maioria dos cariocas. Se por aqui tem gente que sempre reclama da temperatura, a bicharada, por outro lado, faz a festa. Animais do Sul do continente, principalmente da Patagônia argentina e da chilena, chegam à cidade durante esta época do ano.

Dezenas de espécies de aves encantam os ouvidos atentos e são colírio para os olhos dos admiradores. Já no mar, não é preciso de muita concentração para notar o movimento monumental de uma baleia jubarte ou perceber um pinguim-de-magalhães perdido pela costa.

Algumas aves saem de seus locais de origem em direção ao Rio por um único motivo: o frio é considerado estressante. Muitas têm dificuldade em manter a temperatura corporal por volta de 40 graus, considerada ideal, num lugar onde o termômetro está negativo o tempo todo. O movimento migratório para evitar o inverno é, portanto, muito comum. Acontece que a maioria dos visitantes chega aqui durante o nosso verão, fugindo do gelo que é o Hemisfério Norte. Por uma razão não muito definida, as migrações do Sul da América acontecem em menor escala do que as do Norte.

Dentre as espécies que visitam o Rio, algumas vêm de regiões montanhosas próximas, como Itatiaia, Serra dos Órgãos e Friburgo, atrás de condições semelhantes a de seus habitats naturais e procurando por calor e comida. A aroeira e os frutos do cambuí, do palmito e da embaúba atraem muitos bichos.

Henrique Rajão, ornitólogo e professor do Departamento de Biologia da PUC, calcula que entre 20 e 30 espécies de pássaros escolhem locais como o Jardim Botânico e a Floresta da Tijuca durante o inverno. Dentre eles, o sabiá-una e o saíra-sapucaia, ambos do Sul do continente, e a araponga e o tucão, da Serra. Embora as aves fiquem de três a quatro meses no Rio, elas deixam para se acasalar em seus locais de origem. Ou seja, nada de sexo.

— As aves migratórias passam a maior parte do tempo nas áreas de origem, e elas se reproduzem lá. Se elas se acasalassem aqui, seria um problema, porque os filhotes não conseguiriam voltar. Esses bichos vêm para cá só durante a invernada, passam de três a quatro meses e depois voltam. Por isso, falamos que são visitantes — explica Rajão.

E como os animais não têm calendário para saber que o inverno só começa amanhã, dia 20, alguns acabam chegando um pouco mais cedo. Foi o caso da guaracava-de-crista-branca, fotografada pela primeira vez no Jardim Botânico no mês passado.

Sergio Costa, guia de turismo e fotógrafo nas horas vagas, foi um dos primeiros a fazer o clique da guaracava. Ele costuma frequentar o parque e participar da observação de aves que acontece sempre no último sábado de cada mês. Para ele, a estação mais fria do ano é a melhor época para encontrar os passarinhos.

— Não é tão bom para fotografar durante o verão porque, no calor, os passarinhos preferem ficar dentro da mata. Atrapalha muito. A temporada boa está começando agora… Os machos estão bem coloridos, as aves ficam ativas — revela Costa.

Mas não é sempre que esses animais são vistos. É mais fácil escutar o canto de uma araponga — que muito se assemelha ao barulho de um martelo batendo em uma bigorna — do que flagrar suas penas tão brancas como a neve. Às vezes, é preciso atrair os bichos com a reprodução de seu som, sempre com cautela para não estressar ou acabar afastando o animal.

Muito mais visíveis a olho nu, as baleias jubarte, que medem de 12 a 16 metros, saem da Antártica e sobem a costa do país em busca de águas mais quentes para a reprodução, principalmente no Banco de Abrolhos, na Bahia. Adoram dar pinta pelo Rio, onde, param para descansar. Na quinta-feira da semana passada, uma delas foi vista em Ipanema. Outras duas passaram pela Barra da Tijuca e Angra dos Reis em maio. A baleia franca também passeia por mares brasileiros, com registros do Rio Grande do Sul, área de maior concentração, junto ao centro-sul de Santa Catarina, até a Bahia.

Ainda que as duas espécies sejam bem tranquilas, a bióloga marinha Liliane Lodi, do Instituto Mar a Dentro, recomenda que “as aproximações sejam espontâneas e que não haja perseguição aos animais”. Em um grupo no Facebook chamado “Onde estão as baleias e os golfinhos?”, criado por Liliane, a população é convidada a contribuir com os biólogos postando fotos que ajudem a identificar os mamíferos marinhos que visitam a nossa costa.

Outro grupo de mamíferos também mergulha nessas águas. Passada a época reprodutiva, os leões-marinhos-sulamericanos e lobos-marinhos-sulamericanos saem de suas colônias no Uruguai para se alimentar. As locomoções são favorecidas pela Corrente das Malvinas e alguns podem chegar até o Nordeste. Já o lobo-marinho-subantártico, o lobo-marinho-antártico, a foca leopardo, a foca caranguejeira e o elefante-marinho têm ocorrências ocasionais e quando surgem na costa estão exaustos. Precisam descansar:

— Se pararam aqui é porque estão cansados e querem descansar em praias ou rochas. É muito importante que eles não sejam manipulados ou molestados — afirma Liliane.

O mesmo vale para os pinguins-de-magalhães. Eles vêm surfando pela Corrente dass Malvinas em busca de cardumes de anchoita, mas alguns jovens acabam saindo da corrente sem querer e vão parar na costa do Rio e do Espírito Santo, quase sempre debilitados. Caso sejam avistados, os especialistas recomendam que a patrulha ambiental seja acionada imediatamente.

— Normalmente eles não chegariam à costa, fariam processo de migração e retornariam para as colônias reprodutivas. Quando são resgatados, os animais são alimentados e cuidados. Depois são embarcados em navios e devolvidos ao local de origem — comenta Larissa Cunha, doutora em Ciências Biológicas,

Nem pensar em colocar o pinguim na geladeira.


...........

Siga-nos no Google News Portal CM7