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‘Os mais pobres custam menos e precisam ser preservados’, diz presidente do Insper

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BRASÍLIA – A desvinculação constitucional dos gastos com saúde e educação, prevista na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que fixa um teto para as despesas do governo, é positiva, desde que não prejudique a população mais pobre. A opinião é do presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Marcos Lisboa. Em entrevista ao GLOBO, ele afirmou que a equipe econômica precisa preservar educação e saúde básicas, além dos programas sociais voltados à população mais pobre, como o Bolsa Família. Lisboa sugere ainda que o governo crie uma comissão especial para avaliar a eficiência dos programas sociais: “O Brasil foi muito criativo em criar programas sem metas de resultado, sem avaliação, sem checar sua eficácia”.

O que o senhor achou da PEC que fixa um teto para os gastos públicos?

Ela é um primeiro passo importante para enfrentar o problema do crescimento dos gastos, que têm subido cerca de 6% ao ano pelos últimos 25 anos. Mas não vai ser suficiente. Ela por si só não garante a interrupção de crescimento dos gastos. Será preciso fazer reformas profundas, como a da Previdência.

A PEC desvincula gastos com saúde e educação. Isso pode prejudicar as duas áreas?

Temos que separar saúde básica e educação básica do resto. Estou falando de gastos com professores, salas de aula e escolas do ensino médio e fundamental. Também temos que separar as políticas de transferência de renda para a população mais pobre, como o Bolsa Família. O Banco Mundial tem dados que mostram que, no Brasil, os gastos com os 10% mais pobres correspondem a 16,4% do total das despesas federais. Isso é pouco. Ou seja, os mais pobres custam menos e precisam ser preservados.

Como fica a educação superior?

O Brasil precisa discutir a universidade pública gratuita. Que tipo de alunos ela beneficia? São, na maioria, filhos de famílias ricas que estudaram em escola particular. Essas pessoas deveriam pagar pela universidade.

A regra do teto prevista na PEC é capaz de preservar a saúde e a educação básicas?

Sim, claro. Basta dar mais eficiência às políticas públicas. Nesse campo, estamos com décadas de atraso.

O governo estuda acabar com o abono salarial como forma de conter os gastos obrigatórios. Esse é um gasto para os mais pobres?

Não. O abono não vai para os mais pobres. Acho que o governo deveria instituir uma comissão que fizesse uma avaliação de cada programa social. Ver quanto ele custa, quem se beneficia e se ele é eficaz. O Brasil foi muito criativo em criar programas nos últimos anos sem metas de resultado, sem avaliação, sem checar sua eficácia. Recentemente, fizeram uma avaliação do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) e não conseguiram encontrar nada que mostrasse sua eficiência. Então, para que existir isso? Quantos outros como esse não existem?

A PEC propõe que o teto valha por um período de 20 anos, sendo que, nos nove primeiros, os gastos só poderão crescer com base na inflação do ano anterior. O que o senhor achou desse prazo?

Ele é fundamental. Caso contrário, podemos ter uma situação de insolvência ou de inflação crônica. Esse é um problema que vem de muito tempo no Brasil. Em 2004, 2005 (no governo do presidente Lula, quando Lisboa era secretário de Política Econômica da Fazenda), a equipe econômica propôs um teto para os gastos. Mas a ideia foi imediatamente rechaçada e classificada como rudimentar pela então ministra-chefe da Casa Civil (Dilma Rousseff). Então, estamos nessa situação por culpa nossa. A demora em enfrentar o problema levou o Brasil a uma trajetória insustentável da dívida pública. (Martha Beck)


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