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Novas medidas econômicas: um duro ajuste a longo prazo

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BRASÍLIA – Sem margem para solucionar o rombo bilionário das contas públicas a curto prazo, a equipe econômica do presidente interino, Michel Temer, decidiu abrir mão de cortar gastos e aumentar impostos num primeiro momento e apostar em soluções estruturais que resolvam o problema fiscal do Brasil ao longo dos próximos anos. No pacote anunciado ontem, a principal ação é encaminhar ao Congresso uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos, que passarão a variar de acordo com a inflação registrada no ano anterior. Hoje, não há trava. Para viabilizar esse limite, o governo quer que os percentuais mínimos de arrecadação que a União têm de constitucionalmente aplicar em saúde e educação também fiquem limitados à inflação, mudando a regra em vigor e potencialmente reduzindo a expansão dessas despesas, pois a base serão as receitas de 2016, que caem fortemente.

As medidas foram bem recebidas de forma geral por economistas, empresários e a maior parte das centrais sindicais, por atacarem as despesas sem apelo ao aumento de impostos. Mas os analistas se queixaram da falta de detalhamento das propostas e da ausência de cortes imediatos nos gastos. Alertaram, ainda, que o pacote precisa passar pelo crivo do Congresso, onde uma maioria sólida de Temer não é certeza.

Ciente do desafio, o anúncio de ontem foi feito pelo próprio Temer a lideranças do Congresso, em cerimônia no Palácio do Planalto. O presidente interino citou que as despesas federais saltaram de 14% para 19% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 1997 e 2015. Também se comprometeu com a reforma da Previdência, mas evitou falar num tema crucial para o controle dos gastos: a desvinculação dos benefícios previdenciários da correção do salário mínimo. Embora essa medida esteja nos planos da equipe econômica, Temer se limitou a dizer que haverá um amplo debate em torno da reforma.

— As despesas do setor público se encontram em uma trajetória insustentável. Nós, hoje, podemos nos regozijar por uma ou outra conquista, mas lá na frente nós teremos condenado o povo brasileiro a uma dificuldade extraordinária — afirmou Temer, prometendo ainda outras medidas no futuro.

No total, foram apresentadas seis medidas estruturantes. O governo anunciou a extinção do Fundo Soberano, com a venda de todas as ações do Banco do Brasil em seu poder (R$ 2 bilhões); a devolução de R$ 100 bilhões do BNDES ao Tesouro Nacional em três anos, R$ 40 bilhões em 2016, para reduzir a dívida bruta; e a limitação em todos os ministérios dos gastos com subsídios, que não poderão mais ter aumento real, numa economia projetada de R$ 2 bilhões ao ano.

O governo vai trabalhar, ainda, pela aprovação de dois projetos que estão no Congresso: a flexibilização da participação de 30% da Petrobras como operadora na exploração do pré-sal e a criação de Lei de Responsabilidade das empresas estatais e dos fundos de pensão que elas patrocinam.

Dessas ações, a extinção do Fundo Soberano, o pré-pagamento do BNDES ao Tesouro e a redução dos subsídios têm impacto de curto prazo para as contas do governo, mas nada que seja capaz de reverter o déficit primário de R$ 170,5 bilhões previsto para 2016. A meta fiscal revista do ano deveria ser votada na madrugada de hoje.

No primeiro caso, serão vendidos os R$ 2 bilhões de ações do Banco do Brasil que ainda restam no Fundo, o que ajudaria a reforçar o caixa do Tesouro. Quanto ao BNDES, a devolução dos recursos teria como impacto não apenas a redução da dívida bruta. Daria também uma ajuda de R$ 7 bilhões ao Tesouro.

PEC SÓ SERÁ ENCAMINHADA EM 15 DIAS

O rombo de R$ 170,5 bilhões calculado pelo governo é bem superior ao estimado pela equipe da presidente afastada Dilma Rousseff, de R$ 96,6 bilhões. A diferença nos números ocorreu porque o governo Temer decidiu incluir em seus cálculos o pior cenário fiscal possível para o ano. A ideia foi justamente criar as bases para fazer a travessia para uma solução estrutural para as contas públicas. Ao detalhar as medidas, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, destacou que as ações são mais importantes que cortes de gastos:

— Muito mais importante do que cortes pontuais de despesas temporárias, e que tenham efeito limitado, como se fez muitas vezes no passado, o que nós criamos é algo mais estrutural e com efeito da maior seriedade, que é exatamente um teto para a evolução da despesa nos próximos anos.

Meirelles não apresentou o texto da PEC do teto de gastos e disse que ele só deve ser concluído em duas semanas. Confiando na credibilidade que tem junto ao mercado, disse apenas que o assunto será amadurecido com o Congresso e prometeu que a medida tem condições de fazer com que o gasto público tenha uma redução de 1,5% a 2% do PIB nos próximos três anos:

— É uma reversão fortíssima e muito importante da trajetória do gasto. Isso vai demandar uma série de medidas complementares para que se possa cumprir. É importante haver nessa PEC uma mudança nos critérios de vinculação da saúde e da educação.

Meirelles admitiu que as medidas terão pouco efeito sobre as contas de 2016. A fixação de um teto, disse, só valerá para os próximos anos:

— O déficit de 2016 foi calculado com critérios rigorosos e realistas. Fizemos uma estimativa detalhada e rigorosa. Acredito que o número vai ser esse.

Sobre a indexação dos gastos à inflação, Meirelles ponderou que o IPCA dos próximos anos cairá, para a casa dos 4,5%, portanto sob controle.


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