No Espírito Santo, apesar de crise do petróleo, contas no azul
RIO – Enquanto o Estado do Rio vive uma grave crise fiscal — teve déficit fiscal primário de R$ 4,17 bilhões no ano passado —, o vizinho Espírito Santo, também produtor de petróleo, se orgulha de ter minimizado os efeitos da crise no setor sobre seus cofres. Os capixabas fecharam o ano passado com as contas públicas equilibradas, garantindo superávit de R$ 206 milhões. Parte da diferença está relacionada à arrecadação dos tributos. No Rio, a queda do volume de impostos recolhidos foi de 28,71%, já descontada a inflação. No Espírito Santo, a retração foi bem menor, de 4,57%, de acordo com dados da plataforma Compara Brasil.
No ano passado, as contas do Espírito Santo foram impulsionadas principalmente pela alta em três tributos: ICMS, IPVA e do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que incide sobre heranças e doações. Assim como no Rio, o ICMS é o imposto mais importante da economia capixaba e registrou alta de 4,96% no ano passado, contra avanço de 3,59% no Rio. O estado se beneficiou ainda da alta de 37,3% do ITCMD. Em relação às despesas, cortou 17% dos seus gastos. Nesse caso, o ajuste no Rio foi mais intenso, com redução de 19,87% no ano passado.
FISCALIZAÇÃO MAIS EFICIENTE
Segundo a secretária de Fazenda do Espírito Santo, Ana Paula Vescovi, parte do resultado positivo está relacionada à melhoria da gestão tributária, inclusive de fiscalização. Na prática, a estratégia aumenta o recolhimento de impostos sem elevar alíquotas. Uma das ações foi acelerar o andamento de julgamento de processos tributários.
— (Tivemos) ganhos de eficiência na arrecadação, absorção de tecnologias para que a gente pudesse fazer uma fiscalização mais eficiente, uma revisão ampla de normas. Fizemos um programa de recuperação de ativos, o Refis, com características diferentes dos tradicionais, que visa a abrir uma janela para que contribuintes se tornem adimplentes no estado — lista Ana Paula.
Parte desses ganhos foram com recuperação de dívida ativa, que injetaram R$ 483 milhões nos cofres estaduais. O montante compensou, com sobra, as perdas de R$ 416 milhões que o estado amargou com a queda da arrecadação de royalties de petróleo.
Embora seja fruto de uma melhora na gestão tributária, a professora da UFRJ Margarida Gutierrez, especialista em contas públicas, destaca que esse tipo de receita pode variar.
— Isso dá fôlego para uma hora dessas ter recursos para financiar gastos. Eles tiveram uma receita extraordinária. Ela funciona bem na hora da crise, mas não pode contar — avalia.
Para François Bremaeker, gestor do Observatório de Informações Municipais, a gestão tributária pode fazer a diferença, mas o efeito demora.
— (As duas economias) têm muita semelhança. A grande diferença está na queda da receita tributária. (A gestão tributária) pode fazer efeito, que não é imediato — afirma Bremaeker.
A economia do Espírito Santo é bem menor que a do Rio, o que se reflete nos orçamentos dos dois estados. No ano passado, despesas e receitas fluminenses foram da ordem de R$ 70 bilhões, contra R$ 15 bilhões do vizinho. Os efeitos da crise, no entanto, foram semelhantes.
O boom do petróleo na década passada fez com que, assim como no Rio, essa fonte de renda ganhasse importância nas contas capixabas. Para se ter uma ideia, em 2008, o dinheiro da exploração de óleo e gás era de apenas R$ 145 milhões, equivalente a 1,6% do total da arrecadação. Em 2015, saltou para R$ 1,3 bilhão, ou 9,19%. O governo avalia que é preciso depender menos dos royalties, já que a cotação da commodity dificilmente voltará ao patamar dos US$ 100 o barril, como ocorreu em 2014.
— Temos essa leitura, de que o mercado não se recupera a patamares anteriores. Nossa previsão é de US$ 40 (o barril de petróleo). O mercado está muito instável. Estamos tentando fortalecer ao máximo as receitas próprias, com a preocupação de não aumentar alíquotas de impostos. Nos interessa muito mais arrecadar de forma segura do que forçar uma marcha no aumento de alíquotas e ter um setor produtivo enfraquecido ainda mais. Nosso esforço é cobrir as brechas de sonegação, fazer uma arrecadação mais legítima — afirma Ana Paula Vescovi, secretária estadual de Fazenda.
REPENSAR GESTÃO DO PETRÓLEO
Ana Paula admite ainda que a gestão da receita do petróleo precisa ser repensada. No início dos anos 2000, quando a fonte de renda começou a ser relevante, os royalties eram destinados para investimento. A partir de 2010, começaram a ser incorporados na receita corrente. Ou seja, o Orçamento capixaba está mais exposto ao vaivém dos preços internacionais e do humor do mercado, que, no Brasil, sofre impactos adicionais por causa da crise da Petrobras.
— O Espírito Santo cometeu um erro histórico, de destinar essa renda ao custeio. O grande problema é que ela é uma renda volátil e quando ela falta, o custeio fica descoberto — avalia Ana Paula.
Para 2016, a expectativa é encerrar o ano com as contas equilibradas. Faz parte da estratégia do governo do estado enxugar despesas. Algumas ações são semelhantes às adotadas no Rio, como uma auditoria nas folhas de pagamento.