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Cardeal Ortega, que aproximou Igreja do governo cubano, renuncia

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HAVANA — O cardeal Jaime Ortega, que aproximou a Igreja Católica do governo cubano, mediou a libertação de dezenas de presos políticos e desempenhou um papel importante na retomada das relações diplomáticas entre o país e os Estados Unidos, renunciou ao cargo nesta terça-feira. Ele será substituído como arcebispo de Havana por Juan de la Caridad García Rodríguez, arcebispo da cidade de Camagüey.

O Papa Francisco aceitou a renúncia, apresentada em 2011 acatando uma norma de que arcebispos devem formulá-las ao completarem 75 anos. Ortega teria sido mantido por quase cinco anos mais devido à sua influência num momento sensível para o país. No próximo dia 18 de outubro, ele completa 80 anos.

Ortega foi nomeado arcebispo de Havana em 1981 e supervisionou três visitas de Papas à ilha. O governo cubano tinha tanta confiança nele que o usou como emissário entre os presidentes Raúl Castro e Barack Obama.

Sob sua liderança, a Igreja se estabeleceu gradativamente como praticamente a única instituição independente com grande influência no país. Entrando em áreas a princípio do governo, a Igreja Católica forneceu a dezenas de milhares de pessoas alimentos, treinamento profissional e mesmo livrarias com obras estrangeiras. Com as reformas econômicas de Raúl, apoiou o lançamento de pequenos negócios.

No entanto, a Igreja avançou pouco na tentativa de obter mais acesso a transmissão de programas e permissão para abrir escolas religiosas.

Seu sucessor tem 67 anos e nasceu em Camaguey, filho de um trabalhador ferroviário e de uma dona de casa. García estudou em um seminário em Havana, como parte do primeiro grupo de padres cubanos a receber treinamento completo no país, sendo ordenado em 1972. Monsenhor García se tornou arcebispo de Camaguey em 2002 e presidente da Conferência de Bispos Católicos em 2006 — um posto que antes pertencera a Ortega.

A Igreja descreve García como “um homem de vida simples”, de autoridade discreta e firme. Ele ficou conhecido por atrair mais jovens às igrejas em Camaguey. Cuba tem, atualmente, uma das mais baixas taxas de presença nas missas no continente. Ainda não está claro se será indicado a cardeal.

— A Igreja está iniciando um processo de renovação para se adaptar ao novo e histórico momento que o país está vivendo — disse Enrique Lopez Oliva, professor aposentado de religião da Universidade de Havana.

Ortega, por sua vez, era filho de um trabalhador na indústria do açúcar. Ele nasceu em 18 de outubro de 1936 em Jaguey Grande, na província de Matanzas. Foi ordenado em 1964, justamente quando o governo minava o poder da Igreja. Na época, procissões foram proibidas após se transformarem em protestos contra o governo, que via a Igreja como aliada dos mais ricos. Centenas de padres estrangeiros foram expulsos. Mais de 150 escolas católicas foram estatizadas.

Ortega esteve entre os padres enviados a campos de trabalhos controlados por militares, em 1966. Após ser solto, trabalhou como pároco em sua cidade natal. Só foi nomeado bispo em 1978, em Pinar del Rio, e arcebispo em 1981, já em Havana.

A partir de então, começou silenciosamente a reconstruir a infraestrutura da Igreja em Havana, estabelecendo novas paróquias e reformando mais de 40 igrejas. Instalou a Cáritas na capital, a primeira organização de caridade católica em Cuba.

Em novembro de 1994, João Paulo II o nomeou o primeiro cardeal em Cuba em mais de três décadas — e o segundo na história do país. Dois anos antes, o governo havia retirado a referência constitucional ao ateísmo, e uma gradual reaproximação começou, coroada com a visita de João Paulo em 1998.

Ortega procurava não confrontar abertamente o governo, mas foi o principal mediador para a libertação de presos políticos. Ainda em sua gestão, o país recebeu mais dois Papas: Bento XVI, em 2012, e Francisco, em 2015, que voou direto de Cuba para os EUA, numa demonstração de apoio à retomada das relações.


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