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As outras Palmiras sob ameaça

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A destruição de templos milenares e de relíquias arqueológicas pelo Estado Islâmico (EI) em Palmira jogou luz sobre a frágil situação dos Patrimônios Mundiais da Humanidade em países em guerra. No centro de combates ou alvos de atividades humanas nocivas, espaços culturais e naturais reconhecidos pela Unesco nunca estiveram tão ameaçados como agora. De um total de 1.031 patrimônios, 48 correm o risco de virar pó.

Devastada por uma guerra de mais de cinco anos, a Síria é o país com mais sítios arqueológicos ameaçados de extinção. Todos os seus seis patrimônios mundiais integram a lista da Unesco de lugares sob perigo, incluindo Damasco, Palmira, Bosra e Aleppo — cidades antigas e com grande teor histórico e cultural —, os castelos Crac des Chevaliers e Qal’at Salah El-Din, além das antigas aldeias do Norte do país.

Boa parte de Palmira, conhecida como a “pérola do deserto”, foi encontrada destruída após a sua recaptura das mãos do Estado Islâmico pelo Exército sírio, em março deste ano. Diretora do Centro de Patrimônios Mundiais da Unesco, Mechtild Rossler advertiu contra a ação de grupos extremistas que tentam eliminar a “identidade cultural de comunidades” e fez um apelo para preservação de “patrimônios que não são só de uma nação, mas de todo o mundo”.

— Extremistas não estão atingindo apenas patrimônios. Estão atacando igrejas, mesquitas e grupos diferentes. Eles querem essencialmente destruir a diversidade cultural. Palmira era visitada por turistas estrangeiros. Agora, isso não é mais possível — lamentou Mechtild, em entrevista por telefone ao GLOBO. — A convenção de patrimônios mundias diz que é responsabilidade de toda a comunidade internacional. Devemos trabalhar pela proteção e preservação desses lugares para as gerações futuras.

Enquanto um terço dos patrimônios ameaçados de extinção concentra-se na África (16), outro terço está localizado em países árabes (16) e o restante espalhado entre Ásia e Pacífico (4), Europa e América do Norte (5) e América Latina e Caribe (7). A maioria fica em zonas de guerra e conflitos, como em Síria, Iraque, Iêmen, Afeganistão, Mali e República Democrática do Congo. Mas também há espaços sob risco em países ricos, a exemplo da Cidade Mercantil Marítima de Liverpool, no Reino Unido, ameaçada pelo impacto de construções desenfreadas no seu entorno, e do Parque Nacional de Everglades, nos Estados Unidos, afetado pela contínua degradação de seu ecossistema aquático.

A antiga cidade de Jerusalém, com suas muralhas, é a área com mais anos na lista, desde 1982. O local do nascimento de Jesus, a Igreja da Natividade e a rota de peregrinação em Belém também estão em risco por falta de manutenção.

Propaganda do terror

Também palco de combates entre o Estado Islâmico e forças do governo, o Iraque tem três patrimônios em perigo de extinção: Assur, a primeira capital da Assíria; as ruínas milenares de Hatra; e a Cidade Arqueológica de Samarra.

Com cerca de 2.300 anos de existência, as ruínas de Hatra foram atacadas pelo EI em março de 2015, na cruzada do grupo jihadista contra o que considera uma violação à sua interpretação fundamentalista da lei islâmica. A destruição, exibida em vídeo divulgado pelo próprio grupo, foi considerada um marco na estratégia de limpeza cultural no Iraque e denunciada pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, como um crime de guerra.

Mais do que dominar territórios e ampliar suas áreas de influência, grupos terroristas usam patrimônios mundiais como forma de propaganda, segundo Roger Michel, diretor-executivo do Instituto de Arqueologia Digital (IDA).

— Não há dúvidas de que extremistas querem controlar áreas históricas. Eles usam a imagem da destruição de patrimônios para aterrorizar. É uma forma de mostrar que estão no controle e demonstrar sua autoridade — disse Michel.

O IDA — órgão conjunto das universidades de Harvard e Oxford e do Museu do Futuro de Dubai — foi responsável pela reconstrução do Arco do Triunfo de Palmira. Ao comentar a réplica, exposta na Trafalgar Square, em Londres, Michel criticou o EI por “censurar a História”.

— Monumentos são museus de narrativas culturais. Quando a História é apagada desta forma, ela deve ser restaurada — defendeu o diretor.


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