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Youssef relatou pressão para pagar propina de US$ 5 mi a Cunha, diz delator

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BRASÍLIA — O empresário Leonardo Meirelles relatou nesta quinta-feira ter sido informado pelo doleiro Alberto Yousseff de que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), recebeu US$ 5 milhões desviados da Petrobras. Ele informou que usava as contas de suas empresas no exterior para movimentar dinheiro de Youssef, mas não tinha conhecimento de que parte desses valores eram para Cunha. O fato só lhe foi contado posteriormente, durante um almoço com o doleiro. Meirelles, que é um dos delatores da Operação Lava-Jato, prestou depoimento no fim da manhã e no começo da tarde desta quinta-feira no Conselho de Ética da Câmara.

O empresário também disse que os extratos das contas dele e do empresário Júlio Camargo, além de documentos entregues aos investigadores e vários depoimentos dos delatores, dão suporte à versão de que o dinheiro foi pago a Cunha. Mas evitou dizer categoricamente ter feito repasses ao deputado. Camargo, que também é delator, já disse aos investigadores que era pressionado pelo deputado para fazer pagamento de propina.

— Alberto Youssef utilizava minhas empresas tanto para receber como para fazer pagamentos. Em geral, ele me entregava só as informações bancárias — disse Meirelles, acrescentando: — Alberto Youssef me colocou, de forma informal, num almoço, que esses recursos eram para Cunha.

Meirelles disse saber que os US$ 5 milhões eram provenientes da Petrobras. E afirmou que os recursos foram entregues a Youssef. Numa das oportunidades em que parte do valor foi deixado no escritório do doleiro, ele disse que estava presente o ex-policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Jayme Careca, apontado como um dos entregadores de dinheiro de Youssef. E que o doleiro fez referências a Júlio Camargo na ocasião.

— Os US$ 5 milhões foram transformados em reais e entregues no escritório de Alberto Yousseff em São Paulo. Em uma dessas oportunidades tinha uma pessoa aguardando, que era o senhor Jayme, que estava indo para o Rio de Janeiro. Mas (Youssef) sempre tratava do assunto do Julinho (Júlio Camargo) — disse Meirelles.

A tomada do depoimento dele e de outros delatores da Lava-Jato chegou a ser questionada por Cunha no Supremo Tribunal Federal (STF), mas a ministra Cármen Lúcia negou o pedido do presidente da Câmara. Cunha é acusado de ter mentido sobre contas bancárias mantidas na Suíça e vem recorrendo a vários expedientes para retardar o processo aberto contra ele.

Em entrevista após o depoimento, Marcelo Nobre, advogado de Cunha, disse que o depoente corroborou a defesa, ao dizer não ter conhecimento de contas de Eduardo Cunha. Apesar de ser investigado por corrupção na Justiça, o processo de Cunha no Conselho de Ética se centra na questão de ter omitido contas na Suíça.

— A imputação ao meu cliente é se mentiu ou não mentiu na CPI, se tem conta ou não no exterior. E a eventual falsidade na declaração de renda com relação a isso. E com relação a isso, o delator mostrou que não tem provas — disse Nobre.

O relator caso, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO), também em entrevista à imprensa, deu outra opinião. Segundo ele, fatos novos, que não digam respeito à omissão das contas, poderiam ser investigados. De qualquer forma, o relator afirmou que o depoimento se juntará a outros elementos para avaliar se Cunha deve ser punido ou não.

— Ele faz uma alegação indireta de que tomou conhecimento de depósito, de que a transferência foi para o senhor Eduardo Cunha. Ele apresenta dados importantes quando faz referência a dinheiro ilícito, de propina, do crime saiu de empresas do Brasil e foram para contas em Hong Kong, e que depois esse dinheiro teria sido repassado para Eduardo Cunha. Mas não apresenta informação concreta de que ele teria repassado. Então o depoimento foi importante, mas tem que ser considerado com essas peculiaridades. No conjunto dos fatos, nós vamos poder determinar se isso se confirma ou se não se confirma — disse Marcos Rogério.

Enquanto deputados críticos de Cunha ressaltaram a importância do depoimento, seus aliados o minimizaram. O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), aliado de Cunha, chamou a decisão de ouvir Meirelles de pirotecnia. Mais calmo que no começo da sessão, quando havia a expectativa de que o depoimento de Meirelles seria mais comprometedor, o parlamentar destacou que o próprio Meirelles disse não ter conhecimento de contas de Eduardo Cunha no exterior. O deputado Sérgio Moraes (PTB-RS), outro aliado de Cunha, ironizou o depoente.

— Me impressiona que pagou a passagem para vir aqui não dizer nada — disse Moraes, acrescentando: – Veio aqui para fazer um show de pirotecnia, se apresentar como um bom menino.

Trata-se de uma referência ao fato de Meirelles ter ido a Brasília com passagem paga por ele mesmo. Segundo o presidente do Conselho de Ética, o deputado José Carlos Araújo (PR-BA), apesar de o pedido ter sido feito há oito dias, a Câmara não custeou o transporte. Isso seria uma tentativa de retardar ainda mais o processo contra Cunha. Nesta quinta-feira, antes do começo do depoimento, Araújo disse que pedirá que Meirelles seja ressarcido.

Deputados críticos a Cunha afirmaram que Meirelles trouxe contribuições importantes ao processo, ao confirmar ter ouvido de Youssef que os valores seriam destinados ao presidente da Câmara.

— Me parece que a questão central foi respondida. O senhor Leonardo me pareceu um tanto intimidado, acanhado ao responder no transcurso dos questionamentos. Não acho que o senhor veio aqui fazer pirotecnia. O senhor trouxe algo que é relevante e confirma aquilo que já está sendo dito no acordo de delação premiada pela imprensa — afirmou Betinho Gomes (PSDB-PE).

— O que o senhor Leonardo Meirelles trouxe aqui é extremamente valioso — acrescentou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), outro adversário de Cunha.

— Essas informações são mais que suficientes para nós. O depoimento é muito claro, contundente — declarou Alessandro Molon (Rede-RJ), que também se opõe a Cunha.

Laerte Bessa (PR-DF) usou o seu tempo para negar a existência de uma tropa de choque com o objetivo de defender o presidente da Câmara, da qual ele próprio faria parte, mas não fez perguntas a Meirelles.

— Não tenho pergunta para fazer, porque ele não trouxe nada de novo — disse Bessa.

FORÇA-TAREFA RECEBE 145 EXTRATOS

Meirelles entregou ao Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia Federal (PF) 145 extratos bancários e comprovantes de depósitos de propinas pagas no exterior para beneficiários de fraudes na Petrobras e outras áreas públicas. Youssef disse ter recorrido a Meirelles para pagar US$ 2 milhões ao lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, e que o dinheiro teria como destino final Cunha. Youssef e Baiano também fazem parte da lista de delatores da Lava-Jato que, se dependesse de Cunha, seriam impedidos de falar.

No começo da sessão, o relator do caso, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO), atacou o atraso da Câmara em responder o pedido de compra de passagem para Meirelles depor no Conselho de Ética.

— O tempo corre contra o Conselho. O prazo para instrução é de 40 dias. Se a cada pedido de passagem tivermos essa postergação, vamos terminar em 2017 – disse o relator, acrescentando: — Isso é claramente um processo de obstrução ao trabalho do Conselho de Ética.

— Não quero que a turma contra o impeachment (da presidente Dilma Rousseff) use o depoimento faça pirotecnia – rebateu o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), aliado de Cunha.

— Vossa Excelência está açodado — disse Rogério.

— Não, estou muito tranquilo — devolveu Marun, ainda exaltado.

— É evidente a aparência — respondeu o relator.

Depois, quando o depoimento já tinha começado, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), contrário a Cunha, criticou a estratégia dos aliados do presidente da Câmara de misturar o processo no Conselho ao impeachment de Dilma. Segundo eles, as acusações contra Cunha tirariam o foco do processo que pode resultar no afastamento da presidente da República.

— O que acontece aqui é que tem companheiros fazendo tanta confusão nessa celeuma. Além de cidadão, o que o senhor tem a ver com o processo de impeachment? — questionou Júlio Delgado.

— Nada — respondeu Meirelles.

Inicialmente, por orientação da defesa, Meirelles não assinaria o termo de compromisso para dizer a verdade. Mas após reclamações de parte dos deputados, ele voltou atrás.

— Leonardo aparece a esta sessão atendendo a um convite. Não viemos por interesse pessoal. É interesse da nação brasileira. Ele vem colaborando, e assumindo compromisso perante o Judiciário, a Polícia Federal, o Ministério Público. Leonardo não está aqui para mentir, mas para elucidar os fatos – disse o advogado de Meirelles, Haroldo Nater.

O relator Marcos Rogério agradeceu a decisão de assinar o termo, mas destacou:

— Os nobres deputados que conhecem os precedentes sabem que, neste conselho, na maioria das vezes, não se assinou o termo de compromisso. E mesmo na CPI (da Petrobras), onde o depoente esteve, não assinou o termo.

Enquanto Meirelles prestava depoimento, a assessoria de Cunha distribuiu uma petição protocolada pelos advogados de Youssef na Justiça Federal do Paraná em fevereiro de 2015. No texto, eles acusam Meirelles de mentir ao dizer que Youssef omitiu seu patrimônio, sem indicar provas. “Meirelles é um criminoso confesso, mentiroso contumaz!!!!”, diz trecho da petição do ano passado.


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