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Saída de petistas históricos do cenário político após escândalos enfraquece legenda

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SÃO PAULO – Se tiver o seu impeachment aprovado hoje pela Câmara, a presidente Dilma Rousseff entrará para o grupo de estrelas petistas implodidas ao longo de quase 14 anos do partido no poder. Nesse período, uma espécie de maldição atingiu todos os quadros do partido que, em algum momento, chegaram a ser apontados como herdeiros da liderança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Encabeçam a lista os ex-ministros José Dirceu (Casa Civil), Antonio Palocci (Fazenda), o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (SP) e o ex-presidente da legenda José Genoino. A constante queda de lideranças é apontada internamente como responsável pelo desgaste da imagem do partido e pelo seu enfraquecimento político.

A primeira estrela petista a cair foi Dirceu. Homem forte do governo Lula, foi acusado, em 2005, pelo então presidente do PTB, Roberto Jefferson, de ser o chefe do mensalão, esquema de pagamento de mesadas a parlamentares para garantir apoio ao governo no Congresso. Obrigado a deixar a Casa Civil, Dirceu reassumiu o seu mandato de deputado federal. Mas depois teve o mandato cassado na Câmara.

Supremo condena três estrelas petistas

Antes da eleição de Lula, Dirceu, como presidente do PT, foi o responsável por controlar o radicalismo das correntes mais à esquerda da legenda e viabilizar assim a chegada ao Planalto.

Herdeiro da presidência do PT depois que Dirceu foi para a Casa Civil de Lula, Genoino também foi atingido pelo mensalão, após a revelação de que havia assinado um dos empréstimos fraudulentos que abasteceram o esquema.

Três anos antes de ser envolvido no mensalão e abandonar a presidência do PT, Genoino havia se tornando o primeiro candidato do partido a chegar ao segundo turno de uma eleição ao governo de São Paulo. Acabou derrotado pelo tucano Geraldo Alckmin, na ocasião, mas acumulou capital político. O partido nunca mais teve desempenho semelhante em eleições no estado.

O mensalão também atingiu João Paulo Cunha. Com trajetória de vida, discurso e até a mesma profissão que Lula (os dois foram metalúrgicos), o então presidente da Câmara era apontado como provável candidato ao governo de São Paulo em 2006. Mas um ano antes, foi revelado que a sua mulher sacara R$ 50 mil da conta da empresa do publicitário Marcos Valério, apontado como operador do mensalão. A agência de Valério ganhou uma licitação para prestar serviço para a Câmara, na mesma época.

Em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou as três estrelas petistas à prisão. Dirceu pegou sete anos e 11 meses, Genoino, quatro anos e oito meses e João Paulo, seis anos e quatro meses. Em agosto do ano passado, quando cumpria prisão domiciliar pelo mensalão, Dirceu ainda foi preso por envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras. Já denunciado pelo Ministério Público Federal, aguarda, na prisão em Curitiba, a decisão do juiz Sérgio Moro sobre o seu destino.

Depois do mensalão, foi a vez de Palocci. Em 2006, o caseiro Francenildo Costa acusou o então todo poderoso ministro da Fazenda de ser frequentador de uma casa em Brasília por onde passavam lobistas. No local, também teria havido partilha de dinheiro oriundo de corrupção.

Mas, apesar da acusação, a queda de Palocci só aconteceu quando a Caixa Econômica Federal promoveu a quebra do sigilo de uma conta do caseiro sem autorização judicial e enviou as informações ao ministro. Na conta de Francenildo, havia um depósito de R$ 40 mil, que governistas atribuíram a um suposto pagamento pelas denúncias feitas. Mas, em seguida, o caseiro conseguiu provar que o dinheiro havia sido transferido por seu pai.

No início do primeiro governo, Dirceu e Palocci eram apontados como os nomes que disputariam a indicação de candidato presidencial do PT em 2010. A queda dos dois abriu espaço para Lula alçar Dilma ao posto.

— Havia uma disputa entre o Dirceu e o Palocci dentro do governo, e essa disputa tinha como foco central a sucessão do Lula — afirma um cacique petista.

Depois do mensalão, Dirceu continuou atuando nos bastidores dentro do PT, mas nunca mais teve a mesma força política. Já Palocci conseguiu uma reabilitação, quando em 2009, o STF rejeitou a denúncia do MPF contra ele por causa da quebra do sigilo do caseiro.

Inocentado, o ex-ministro assumiu papel de destaque na coordenação da campanha de Dilma, em 2010, e se habilitou a ser o homem forte de seu governo, assumindo o ministério da Casa Civil. Mas essa volta ao centro do poder foi breve. Em julho de 2011, as revelações de que Palocci havia comprado um apartamento de R$ 6,6 milhões, nos Jardins, em São Paulo, e de que sua empresa de consultoria faturara quase R$ 35 milhões nos quatro anos anteriores tornaram insustentável a sua permanência no governo.

Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, as quedas das estrelas petistas ajudam a explicar a crise que o partido enfrenta hoje.

— Houve um rebaixamento terrível da qualidade da liderança política do PT, que levou o partido a essa tragédia — avalia o professor.

De acordo com Melo, os substitutos das lideranças abatidas nos escândalos não possuem a mesma capacidade de articulação política de seus antecessores.

— Não é possível comparar o (atual presidente do PT) Rui Falcão com o José Dirceu, por exemplo. É possível falar tudo do Dirceu, mas em termos de visão estratégica, habilidade política e capacidade de comunicação, ele está muito à frente do Rui Falcão.

“O PT está no gueto ideológico”

Ainda na avaliação do cientista político, a perda de lideranças contribuiu para afastar a legenda da sociedade:

— O PT foi indo para o gueto e está no gueto ideológico. Virou um partido de militantes, que deixou de falar com a sociedade há algum tempo. Porque essas lideranças tinham capacidade de mobilizar a sociedade.

Um dirigente petista reconhece que o PT viveu nos últimos anos uma crise de comando e que os escândalos desestruturam o funcionamento da legenda.

Além das estrelas públicas, o PT também viu nomes fortes da burocracia partidária, como os ex-tesoureiros Delúbio Soares e João Vaccari Neto e o ex-secretário geral Sílvio Pereira serem afetados por escândalos ao longo desse período no poder.

Delúbio foi condenado a oito anos e 11 meses no mensalão por repassar dinheiro aos parlamentares do esquema. Sílvio Pereira, que foi denunciado por receber de presente uma Land Rover de uma empresa fornecedora da Petrobras, fez um acordo para prestar serviço comunitário e evitar punição. Os dois também são investigados agora na Operação Lava-Jato.

Já Vaccari é apontado pela força-tarefa da Lava-Jato como um personagem central do esquema de desvio de recursos da Petrobras. Ele já foi condenado a 15 anos e quatro meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa. De acordo com a sentença, o tesoureiro operacionalizou o recebimento de mais de R$ 4 milhões oriundos de propina de contratos da Petrobras por meio de doações oficiais de empreiteiras ao partido.


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