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Relação Brasil-EUA pode se tornar mais pragmática em economia

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WASHINGTON – O fim da Era PT não deve trazer uma revolução na relação entre Brasil e Estados Unidos, como foi visto na recente mudança de governo na Argentina. Mas especialistas e fontes ligadas à diplomacia das duas nações acreditam que a nova gestão deve trazer um novo discurso, e os americanos poderão aproveitar esta fase mais pragmática das relações exteriores de Brasília.

Ontem, o porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, afirmou que o Brasil vive momento desafiador, mas que os EUA confiam nas instituições democráticas para o país superar a crise. Ele evitou analisar se a troca de governo seria melhor para os interesses americanos, lembrando que seu país trabalhou bem em diversos pontos com Dilma Rousseff.

— Obviamente, o Brasil está sob os holofotes internacionais. E os EUA vão estar lá para apoiar o amigo e parceiro nestes desafios significativos que estão surgindo agora — enfatizou Earnest.

Por sua vez, o diretor do Instituto Brasil do King’s College, em Londres, o americano Anthony W. Pereira espera por mudanças, mas nada muito drástico:

— Não vejo o governo de Temer, ainda mais se José Serra for o chanceler, fazer uma revolução na política externa. Mas deverá dar mais ênfase ao Itamaraty do que Dilma, até para confirmar sua legitimidade internacional — ressaltou Pereira. — E deve adotar um discurso mais aberto e liberal, pragmático, que pode ser aproveitado pelos americanos no comércio e investimentos.

Altos e baixos na relação

O raciocínio é acompanhado por Peter Schechter, diretor do Adrienne Arsht Latin America Center, parte do Atlantic Council:

— Não vejo mudança revolucionária com Temer. Pode haver um discurso mais positivo e, se o Itamaraty tiver maior flexibilidade, a relação pode melhorar.

Nos últimos 13 anos, a relação passou por altos e baixos. De início, Lula ajudou a sepultar a proposta da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), numa decisão cara a Washington. Ao mesmo tempo desenvolveu, por incrível que pareça, uma relação de amizade com George W. Bush — tão ideologicamente distante do petista. Na gestão de Barack Obama, que chamou Lula de “o cara”, as conversações esfriaram, mas nunca morreram.

Alguns episódios estremeceram a agenda entre as duas maiores nações das Américas, como a tentativa de Lula fechar um acordo com o Irã, ainda no “eixo do mal”, e da espionagem da NSA sobre Dilma, que chegou a adiar uma viagem aos EUA. Outros pontos foram convergentes, como as questões ambientais e, mais recentemente, a luta contra o vírus zika, que deu um salto na cooperação científica.

Nos anos PT, o Brasil diversificou a agenda externa, focando em frentes como G-20 e os Brics. Assim, os EUA perderam importância relativa para o Itamaraty, mas sem ficarem em segundo plano. Acordos importantes foram firmados, em áreas como Defesa, pesquisa e comércio.

A nova simbologia e pragmatismo poderão, segundo interlocutores dos dois países, promover acordos na área de tributação, investimentos e intercâmbios científicos. Afirmam que hoje não há um “tabu” na relação, embora o Brasil tenha ciúmes da aproximação dos americanos ao pleito da Índia por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, enquanto seguem impassíveis sobre a quase obsessão brasileira pelo assento.

Pereira lembrou ainda que os EUA também mudaram, como no acordo com o Irã e a normalização das relações com Cuba:

— O que mais pode afetar a relação EUA-Brasil não é o governo Temer, mas as eleições americanas. Se Trump vencer, expulsar imigrantes ilegais e construir o muro na fronteira com o México, além de seu discurso protecionista, prevejo muitos problemas com a América Latina.

‘Global entry’ na mira

Os EUA ofereceram ao Brasil a entrada no programa “Global Entry”, que facilita o acesso ao país a viajantes frequentes. O tema, assunto na visita de Dilma aos EUA no ano passado, está parado em Brasília com a atual crise política, mas, agora, tem tudo para ser retomado. Isso pode facilitar, no longo prazo, um caminho para o tão sonhado fim da exigência de visto americano para turistas brasileiros. Porém, o assunto não consta, hoje, na agenda bilateral.

Nestes anos do PT no Planalto, os EUA receberam uma nova leva de imigrantes brasileiros. Ao mesmo tempo, os EUA tomaram o lugar da Argentina na lista dos maiores compradores de produtos industrializados do Brasil. Capitalistas brasileiros estão à frente de empresas emblemáticas americanas, como Burger King, Budweiser e Swift. Washington também não criou tensões depois que o Brasil escolheu caças suecos no lugar de aviões da Boeing — o caso foi tratado como uma questão comercial, e não geopolítica.


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