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Ministro da Justiça acusa Moro de cometer crime

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BRASÍLIA – Depois de assumir o comando do Ministério da Justiça, o subprocurador-geral da República Eugênio Aragão acusou o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, de ter cometido um crime ao divulgar diálogos sigilosos da presidente Dilma Rousseff com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o ministro, ao se deparar com o nome da presidente na investigação sobre o ex-presidente, Moro deveria ter interrompido a apuração e enviado imediatamente os autos do inquérito para o Supremo Tribunal Federal (STF) ao invés de tecer comentários e tornar público os diálogos.

— Quando se trata de uma eventual prova obtida em evento fortuito, Sua Excelência o meritíssimo juiz deveria ter fechado os autos e encaminhado ao Supremo Tribunal Federal. Não o fez e mais: ainda declarou de público que achava importante que a população soubesse. Isso cheira muitas vezes artigo 10 da Lei de Interceptações, que qualifica como crime, quando se torna público uma gravação que diz respeito a investigações autorizadas dentro do marco legal e constitucional — afirmou o ministro.

Aragão argumenta que, pela lei, o foro para apreciar investigações relacionadas a presidente da República é o STF e não a Justiça de primeira instância. O ministro reforçou ainda as acusações sobre suposta ilegalidade das interceptações das conversas entre a presidente da República e o ex-presidente. Os diálogos teriam sido interceptados pela Polícia Federal por volta das 13h30 de ontem, quase duas horas depois da ordem do próprio Moro para a interrupção do monitoramento de telefones de pessoas ligadas ao ex-presidente.

— Existem várias circunstâncias que sugerem que tenha sido uma interceptação ilegal. E nós vamos atrás delas com muito rigor. E tirar as consequências disso, doa a quem doer — afirmou.

O ministro também criticou vazamentos supostamente seletivos de investigações criminais, que mancham reputações antes mesmo da conclusão dos processos. Segundo ele, uma pessoa acusada publicamente de cometer um crime, não tem como recuperar a reputação, mesmo se depois for declarada inocente.Para ele, uma democracia republicana como a brasileira não pode admitir este tipo de procedimento.

Aragão defendeu ainda o conteúdo de um dos diálogos do ex-presidente Lula com a presidente Dilma. Na conversa grampeada no início da tarde de ontem, a presidente disse ao agora ministro da Casa Civil que estava enviando o termo de posse e que ele deveria assinar somente “em caso de necessidade”. Para o ministro, a presidente tratou de fato de aspectos burocráticos da posse do ex-presidente, e não de uma tentativa de evitar a prisão do petista pela Justiça Federal no Paraná.

— Eu não tenho dúvida nenhuma disso (que o diálogo tratou apenas da posse em si). O diálogo entre ela e seus assessores foi muito claro. O presidente Lula estava com sua esposa doente. Os senhores viram que o ministro Wagner hoje tomou posse sem estar presente. Ele assinou o termo de posse, que nem o presidente Lula assinou o termo de posse — disse.

EXPLICAÇÕES SOBRE TERMO DE POSSE

Os investigadores da Polícia Federal, responsáveis pelo relatório sobre o diálogo da presidente com o ex-presidente, entenderam que Dilma estaria oferecendo a Lula uma proteção contra um eventual mandado de prisão de Moro.

— Os fatos são os seguintes: dona Marisa está enferma, isso faria com que o presidente Lula não estivesse aqui hoje. Só que o ministro Wagner assumiu o gabinete pessoal da presidente da República e o cargo ficou vago. Nesse momento de crise, não podemos ter o cargo de chefe da Casa Civil vago. Foi estabelecido: assine o termo, que aqui chegando a gente faz a posse, que nem fizemos com o ministro Wagner, com a presidente assinando o termo na cerimônia — afirmou.

Para o novo ministro, “está muito claro que não houve ali nenhuma intenção absolutamente de nada”. No discurso durante a transmissão de cargo, Aragão fez críticas veladas a Moro. Para o ministro, nenhuma pessoa pode colocar acima das demais como se fosse a dona da verdade e nem se apresentar como se fosse a solução para os problemas do país.

— Todos queremos o melhor para o país. Mas não existe ninguém neste país com o monopólio da moralidade ou com o monopólio da salvação da pátria — disse.

CITAÇÃO EM GRAVAÇÃOES

O ministro também minimizou a importância da citação ao nome dele num dos diálogos de Lula interceptados pela Polícia Federal. Numa das conversas, Lula reclama que Aragão, embora simpático ao PT, nada faz em defesa de petistas. Segundo ele, o comentário do ex-presidente ocorreu numa esfera privada e não representaria nenhum demérito para ele.

— É uma prova cabal de que minha atuação profissional foi pauta pelo mais absoluto republicanismo — disse.

Ainda na transmissão de cargo, Aragão disse que tentará conversar com todas as forças políticas, inclusive representantes da oposição ao governo federal. Depois de citar o filósofo alemão Emmanuel Kant, o ministro disse numa democracia é fundamental cultivar o discurso de que todos são iguais e não apenas respeitar os adversários, mas legitimar a alteridade, as diferenças de pontos de vista numa mesma sociedade.

— Se essa legitimação é ignorada, nós passamos para exclusão do outro, para sua eliminação, o que dá margem a massacres e genocídios na sociedade — afirmou.

Aragão disse que é preciso cautela para evitar que críticas a administradores públicos se transformem na demonização da política. Para ele, o rebaixamento da política representa uma ameaça não só aos políticos, mas a própria democracia.

— A criminalização da política é a criminalização da democracia. Estejamos atentos a isso para que não percamos conquistas que temos conquistado desde 1985 — afirmou.

O ministro ainda criticou as corporações, entre elas grupos vinculados à Polícia Federal e ao Ministério Público, que colocam os interesses próprios acima dos interesses da sociedade. Para ele, estas corporações não podem se apropriar do Estado. A indicação de Aragão tem sido duramente criticada pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal. Para a associação, a troca de ministros da Justiça seria suspeita porque aconteceu depois de ataques de parlamentares do PT José Eduardo Cardozo, hoje advogado-geral da União.

Cardozo era criticado porque, segundo petistas, ele teria deixado setores da Polícia Federal sem controle. Estes setores estariam sendo instrumentalizados nas disputas políticas. A solenidade de transmissão de cargo do ex-ministro Wellington César Lima e Silva, que ficou no cargo por 14 dias, para Aragão teve baixa presença de convidados. Nenhum ministro do governo ou dos tribunais superiores compareceu ao evento.


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