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Esquema de compra de MPs pagou parlamentares, diz Ministério Público

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BRASÍLIA — O esquema criminoso que influenciou a tramitação de medidas provisórias a favor de indústrias do setor automobilístico, denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) na Operação Zelotes, contou com pagamentos a parlamentares em legislatura passada, segundo as alegações finais do MPF entregues na última segunda-feira à Justiça Federal em Brasília. Os procuradores da República Frederico Paiva e Hebert Mesquita afirmam que um e-mail de José Ricardo da Silva, lobista e ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), é “prova que dissipa qualquer dúvida em relação à ilicitude da atuação dos membros da organização criminosa”. A mensagem trata de um suposto pagamento a parlamentares.

No e-mail, de 29 de dezembro de 2009, o ex-conselheiro do Carf afirma não ter conseguido falar com parlamentares e que fará “toda a prestação de contas com os devidos acertos”. “É importante que eles entendam que não é conveniente que os acertos sejam feitos sempre de imediato. As receitas e as retiradas devem obedecer um fluxo normal, pertinente com as atividades do escritório”, continua o lobista na mensagem, reproduzida no documento de 274 páginas com as alegações finais do MPF.

Os procuradores da República não se aprofundaram no suposto envolvimento de parlamentares nem há informação sobre remessa das citações ao Supremo Tribunal Federal (STF), instância responsável por processos de pessoas com foro privilegiado. O e-mail não se referiu a “um único parlamentar”, como registram os procuradores, e trata genericamente desse suposto envolvimento de autoridades do Congresso.

“A organização criminosa estabeleceu débitos com parlamentares federais, conforme está na mensagem eletrônica. Embora os parlamentares não tenham sido identificados, fato é que ficaram credores de José Ricardo e seu grupo, por motivos nada republicanos”, citam nas alegações finais. “Nota-se a preocupação em dissimular os valores que iriam ser repassados aos parlamentares, objetificando, dessa forma, ocultar a verdadeira natureza do serviço prestado”.

A argumentação dos procuradores diz respeito ao processo da Zelotes que já resultou em denúncia à Justiça em Brasília. Em novembro do ano passado, o MPF denunciou 16 pessoas por envolvimento em negociação para aprovação de três medidas provisórias, em 2009, 2010 e 2013. A Justiça já realizou as audiências para ouvir os acusados e testemunhas. Um deles é José Ricardo da Silva, denunciado por suspeita de participação nos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e extorsão.

Outros inquéritos estão em curso, inclusive com investigação sobre o ex-presidente Lula e sobre um de seus filhos, Luis Cláudio Lula da Silva. Uma empresa de Luis Cláudio, a LFT Marketing Esportivo, recebeu pagamentos de R$ 2,5 milhões a título de consultoria da Marcondes e Mautoni. Mauro Marcondes Machado e a mulher, Cristina Mautoni Machado, também foram denunciados pelo MPF por suspeita de organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção ativa.

Nas alegações finais, os procuradores da República relatam a proximidade de Marcondes ao ex-presidente Lula. Eles falam em “acesso privilegiado de Mauro Marcondes à Presidência da República”. O lobista é amigo do ex-presidente, segundo o MPF.

A proximidade também existe em relação ao ex-chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, conforme os procuradores. “É coerente afirmar que o acesso direto ao então presidente da República possui um preço ‘diferenciado’, ou seja, mais elevado, o que seria possível em razão da relação de amizade que existia entre Luiz Inácio Lula da Silva e Mauro Marcondes”, citam as alegações finais.

O documento também relata que Marcondes pediu que Carvalho entregasse uma carta “ao Marco (assistente do Mercadante)”. “Vem a ser Marco Antônio de Oliveira, ex-secretário-executivo da Casa Civil e homem de confiança do ministro Mercadante”, diz o MPF. Mercadante foi ministro da Casa Civil no governo da presidente Dilma Rousseff e hoje é ministro da Educação.

O número dois do Ministério da Fazenda, o secretário-executivo Dyogo Henrique de Oliveira, também é citado nas alegações finais. Dyogo confirmou encontros com Marcondes, mas negou ter tratado de algo ilícito com o lobista. “Chamou a atenção no depoimento de Dyogo Henrique o fato de ele não saber quantas vezes se encontrou com Mauro Marcondes nem explicar por que não existe registro ou ata destas reuniões. A ausência de registro das reuniões com o lobista Marcondes viola o Código de Ética da Alta Administração Federal, a qual Dyogo estava vinculado na época dos fatos”, dizem os procuradores.

Já a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra ajudou José Ricardo da Silva a ser conselheiro do Carf quando ela era secretária-executiva da pasta, conforme as alegações finais. “Usando do poderoso cargo de secretária-executiva da Casa Civil, Erenice recebe de seu irmão o currículo dos advogados da SGR, dentre eles José Ricardo, e envia o ‘curriculum dos meninos’, provavelmente para o Ministério da Fazenda. A intervenção de Erenice ajuda a explicar a permanência de um advogado medíocre como José Ricardo durante sete anos em um conselho destinado a decidir o destino de bilhões de reais”, afirma o MPF.


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