Artigo: Lula coagido a depor, por Frei Betto
Quando o sindicalista Lula foi preso, em 1980, eu estava na casa dele, em São Bernardo do Campo. Pressionado por policiais do Deops, fui acordá-lo. Detido ao longo de um mês e enquadrado na Lei de Segurança Nacional, depois mereceu a absolvição da Justiça Militar.
Ontem Lula sofreu mais uma “prisão”. De fato, um mandado coercitivo que o obrigou a depor na Polícia Federal. Muitos transformaram a convocação em prisão e o depoimento em confirmação de que há um novo réu na Lava-Jato.
O juiz Sérgio Moro é um homem midiático, o que, segundo meu pai, também magistrado, não combina com a egrégia função. Moro faz um bom trabalho na apuração da Lava-Jato, mas prefere os aplausos do público ao convocar testemunhas e suspeitos. E a Polícia Federal, no modo de agir, só comprova que o governo Dilma respeita sua autonomia.
O PT cometeu muitos erros ao longo de seus 14 anos à frente do governo do Brasil. Disso trato em meus livros “A mosca azul” e “Calendário do poder”. Os três símbolos da identidade do partido perderam credibilidade: organizar a classe trabalhadora; ser ético na política; realizar reformas estruturais.
Embora os dois mandatos de Lula e o primeiro de Dilma sejam os melhores de nossa história republicana (basta conferir os índices sociais e econômicos), o PT agarrou o violino do poder com a mão esquerda para tocar com a direita… Alianças promíscuas o fizeram perder a credibilidade, sobretudo agora que Dilma propõe um ajuste fiscal que penaliza, principalmente, os mais pobres.
O fato de Lula depor na PF o transforma, aos olhos de parte da opinião pública, em réu e criminoso. Quando o emocional se sobrepõe ao racional, faltam pedras para jogar na Geni!
Um fato preocupa: o PT jamais julgou a conduta ética de seus militantes acusados pela Lava-Jato. Nem os absolveu, nem os condenou. Calou-se. E quem cala consente.