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Após aprovação de parecer, Cunha fica a um passo da cassação

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BRASÍLIA — Em decisão surpreendente, o Conselho de Ética da Câmara pediu a cassação do mandato do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Por 11 votos a 9, o parecer do deputado Marcos Rogério (DEM-RO) foi aprovado, com dois votos que nos últimos dias eram dados como certos para Cunha: o de Tia Eron (PRB-BA) e, em virada de última hora, do deputado Wladimir Costa (SD-PA). A decisão pegou Cunha de surpresa e, na opinião de aliados e opositores, torna improvável sua absolvição no plenário da Casa.

Desde que o voto aberto nas cassações de mandato foi aprovado, o plenário da Câmara aprovou todas as recomendações do Conselho de Ética: as cassações do deputado preso Natan Donadon e de André Vargas e a suspensão do deputado Carlos Alberto Lereia. Na terça-feira, uma frase de Tancredo Neves era lembrada no plenário: peça qualquer coisa a um político, menos que ele se suicide.

— Com o voto aberto, cada um pensa em seu próprio pescoço. E a opinião pública já escolheu um lado: contra Cunha — disse um dos deputados.

Depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) afastou Cunha da presidência e do mandato, aliados insistiram para que ele renunciasse à presidência da Casa para facilitar a aprovação de uma pena mais branda. Cunha jamais aceitou a hipótese. Ontem, após a derrota, nem o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), um dos mais fiéis aliados de Cunha, tinha uma estratégia clara.

— Não sei o que fazer agora, confesso que estou perdido — disse Marun, com semblante abatido.

PREOCUPAÇÃO NO PLANALTO

Entre os aliados do presidente interino Michel Temer, há preocupação com as consequências que a saída de Cunha da presidência pode provocar: a sucessão dele, mesmo que em mandato tampão, pode abrir flancos na base aliada. Os partidos do chamado “centrão” tentarão impor um nome, e os da antiga oposição, encabeçada por PSDB e DEM, podem tentar negociar outro nome com PT e os partidos que ainda apoiam Dilma Rousseff.

No Planalto, a reação se resumiu a duas palavras: silêncio e apreensão. Ministros e auxiliares diretos de Temer se esquivaram de opinar publicamente sobre a situação do peemedebista, seguindo orientação de evitar declarações até que saibam o tom que será adotado por Cunha. Ninguém acredita também que ele consiga reverter a cassação no plenário da Câmara.

— A situação é muito delicada. Qual será a reação de Cunha, que tom ele adotará? — indagou um interlocutor do Planalto.

Temer terá que evitar “melindrar” Cunha com gestos ou opiniões. Segundo aliados do governo, os sinais do Planalto serão importantes. Ao voltar do Rio para Brasília, na tarde de ontem, Temer avaliou com seus auxiliares os cenários decorrentes do resultado do Conselho de Ética.

Com Cunha cassado, avaliou o presidente interino, o cuidado do Planalto precisaria ser redobrado para evitar uma “contaminação” na bancada suprapartidária comandada por Cunha. Ele receia que qualquer movimentação abrupta ou declaração descuidada de integrantes do governo prejudiquem as votações e acabem com a ampla maioria que o presidente interino tem na Casa.

Cunha e Temer são aliados históricos e pertencem ao mesmo grupo no PMDB. O partido é tradicionalmente dividido entre integrantes do Senado, comandados pelo ex-presidente José Sarney e pelo presidente do Senado, Renan Calheiros; e pelos representantes na Câmara, liderados por Temer, acompanhado de perto nos últimos anos por Cunha.

Em nota, o presidente afastado da Câmara afirmou que houve parcialidade na condução do processo contra ele e que o processo tem “nulidades gritantes”, que serão objeto do recurso à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)da Câmara, onde ele aposta que o parecer de Marcos Rogério não será levado adiante.

“Também confio que, em plenário, terei a oportunidade de me defender e de reverter essa decisão. Repito: sou inocente da acusação, a mim imputada pelo parecer do Conselho de Ética, de mentir à uma CPI”, afirmou na nota.

No Conselho de Ética, a aprovação do parecer foi comemorada pelos adversários de Cunha, especialmente o presidente José Carlos Araújo (PR-BA):

— Feliz não estou, mas com sentimento de dever cumprido. Contra fatos não há argumentos. A consciência e a pressão do povo falaram mais alto.

O trabalho dos adversários de Cunha agora será pressionar para que o processo seja vota no plenário antes do recesso parlamentar de julho, já que depois virão as Olimpíadas e as eleições municipais.

A representação do PSOL e da Rede contra Cunha foi apresentada em 13 de outubro do ano passado e foi instaurada pelo conselho em 3 de novembro. De lá até ontem, foram diversas manobras de Cunha e seus aliados para retardar o processo.

Na terça-feira, os autores da representação comemoraram. Chico Alencar (PSOL-RJ) disse que, quando entraram com o pedido, foram chamados de “loucos e sonhadores” e que tiveram suas vidas “esquadrinhadas”. E que agora, a pressão é pela cassação e para que Cunha cumpra a ameaça de contar o que sabe:

— Queremos celeridade na CCJ, apreciação em plenário ainda este mês e torcer para o Cunha fazer o que dizem que prometeu: abrir tudo. Que ele saia atirando para o bem do Brasil.


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