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Análise: O dia seguinte, por Ibsen Pinheiro

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Já falei mais sobre o impeachment de Dilma do que sobre o de Collor, o que é compreensível: naquele, há vinte e tantos anos, eu tinha um papel condutor do processo, e, portanto, impositivamente discreto. Agora, sou tratado como uma espécie de perito, ou consultor, embora não seja nem num nem outro. O que mais me pedem é comparação, especialmente as semelhanças.

É mais fácil começar pelas diferenças. Em 1992, o início do processo foi mais claro. Havia precisa definição do crime de responsabilidade. Agora, frágeis pedaladas, insuficientes e mal caracterizadas, a descumprir o primeiro requisito, o de natureza técnico-jurídica. No segundo requisito, o político-popular, também faltava aquela unanimidade do sentimento popular de 1992, e, sem essas características, configurou-se este ano mais a revanche, o terceiro turno.

Outra diferença: aquele era o primeiro processo de impeachment, não no Brasil, mas nas Américas. Precisei definir em questões de ordem o rito inteiro para ajustar a lei 1079, de 1950, à nova Constituição e ao regimento interno da Câmara dos Deputados. Tive que indicar o momento da votação, o prazo de defesa e seus limites, o voto aberto em plenário contra um regimento que o previa secreto, a comissão do parecer por aclamação ou voto secreto, dependendo da disputa.

Em 1992, o presidente de então foi ao Supremo e perdeu, o rito foi confirmado. Agora, o STF interveio com excesso, quando, por exemplo, vedou candidaturas avulsas para o plenário compor a comissão, olvidando que a candidatura avulsa é habitual. Ulysses precisou derrotar Alencar Furtado e Fernando Lyra. Aécio, ele próprio foi avulso contra Inocêncio, ou o notório Severino. A rigor, até o presidente da Constituinte de 1823, Antônio Carlos de Andrada e Silva, foi avulso, contra a vontade de Pedro I.

Agora, as semelhanças, surgidas especialmente depois da delação premiada do senador Delcidio e das gravações desta semana. A presidente interferindo numa investigação judicial configura, em tese, o crime de responsabilidade definido no Art. 85, II, da Constituição Federal: atentar contra o livre exercício dos Poderes, no caso o Judiciário (causa, aliás, da prisão do senador Delcidio). Confirma-se minha antevisão da época, que é mais fácil a unanimidade do que dois terços da Calmara, na dependência da voz das ruas, configurando-se a mais recente parecença.

Por fim, a principal semelhança: a necessidade da arbitragem política de uma crise política. Antes de Collor, só no início do segundo reinado, em 1840, na crise da maioridade de Pedro II, o Legislativo arbitrou. Depois, foram os golpes de estado ou as revoluções. Estou convencido de que os partidos políticos deverão ser os protagonistas da superação da crise ou serão suas primeiras vítimas.

Está claro que é preciso votar logo o impeachment, contra ou a favor, para encerrar o tenso momento que vivemos. Tenho certeza que o dia seguinte, com qualquer resultado, será melhor que o da véspera.


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