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Afastamento de Cunha da Câmara une lados opostos da política

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RIO — Se o país hoje se divide no caloroso debate sobre a legalidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff, nas ruas, bares e redes socais, quando o assunto é Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por outro lado, prevalece o consenso: Cunha tem que sair. Na crise política que mobiliza Brasília, só o apoio ao afastamento do então presidente da Câmara é capaz de unir espectros políticos tão opostos, dentro e fora do Parlamento. Envolvido no esquema de corrupção da Petrobras, segundo investigadores da Operação Lava-Jato, Cunha construiu sua impopularidade tanto entre parlamentares e eleitores da direita quando da esquerda, ou mesmo entre aqueles que se declaram a favor ou contrários ao impeachment da presidente, avaliam pesquisadores ouvidos pelo GLOBO.

— Ficou evidente que Cunha não disse a verdade, quando afirmou que não tinha contas no exterior. Com isso, expôs postura próxima ao de políticos tradicionais brasileiros e usou a pseudologia como forma de comunicação e influência, ao manter um discurso nem totalmente mentiroso, nem totalmente verdadeiro. Deixou seu discurso em uma zona de sombras. Ele é mestre da ambiguidade, de aplicar golpes aos companheiros, tanto da direita quando da esquerda — defende o professor de Ética e Filosofia da Unicamp, Roberto Romano.

Segundo o pesquisador, o peemedebista despertou desconfiança na população e também entre seus pares no Congresso. Para ele, cabe à ética parlamentar falar da maneira menos dúbia, mas Cunha se revelou um mestre da “ambiguidade”. Cunha, então, se aproximou de figuras popularmente associadas à “demagogia”, como Paulo Maluf (PP-SP) e Antônio Carlos Magalhães (DEM-BA), este já falecido, avalia o professor da Unicamp.

— Sendo esse personagem poderoso, despertou a desconfiança e vai além das divisões conjunturais e de posições políticas ou ideológicas. Não podemos dizer que é, absolutamente, culpado ou inocente, mas os indícios desse comportamento ambíguo são importantes. Isso traz uma mensagem de que o representante maior do poder legislativo não é modelo nenhum de fala confiável. Uma República tem que ter República. As pessoas têm que confiar na palavra do legislador — afirma Romano.

UM POLÍTICO IMPOPULAR

Carlos Pereira, da FGV Rio, lembra que, quando presidente da Casa, Eduardo Cunha foi instrumento político tanto do governo, antes do rompimento com a presidente Dilma Rousseff em agosto do ano passado, quanto da oposição, que teve apoio do deputado durante a condução do processo de impeachment na Câmara.

— Quando percebeu que o governo havia perdido o controle, restou uma alternativa, romper. Ele não percebeu, no entanto, que também cavava sua própria cova. Ou Dilma e Cunha sobrevivem juntos ou morrem juntos — diz o pesquisador.

Nas ruas, não houve defesa de Cunha. Pelo contrário, os protestos comemoraram a liminar de Teori Zavascki, que o afastou nesta quinta-feira do mandato de deputado federal a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, decisão depois referendada por unanimidade pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Em seu pedido, Janot apresentou onze motivos que comprovariam a disposição de Cunha de usar o cargo em proveito próprio, como atrasar o andamento do processo que pede sua cassação no Conselho de Ética da Câmara.

— Era de se esperar que Cunha não tivesse suporte, o que não é observado no PT. Seria surpresa se fosse o contrário. Cunha nunca foi um político popular, mas dos bastidores, da negociação. É outro perfil — conclui Pereira.

O professor da UNB, David Fleischer, afirma que a imprensa ajudou a fortalecer a imagem negativa de Cunha, cuja popularidade se manteve em baixa nos últimos meses.

— No geral, ele fez muito mal à imagem da Câmara dos Deputados — diz Fleischer.


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