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Missão da Nasa chega a Júpiter nesta segunda

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RIO – Maior planeta do Sistema Solar, Júpiter provavelmente também foi o primeiro a se formar na nuvem de gás e poeira que circundava o recém-nascido Sol há cerca de 4,6 bilhões de anos. Assim, ele guarda parte do material primordial que construiu tanto a nossa estrela quanto os demais planetas em torno dela, inclusive a Terra. E é justamente a busca dos segredos da origem de Júpiter, e desta forma obter pistas sobre a formação do próprio Sistema Solar, um dos principais objetivos da missão Juno, que chega ao gigante gasoso nesta segunda-feira.

— Apesar de nosso apego natural pela Terra, Júpiter é o principal planeta do Sistema Solar — destaca Alexandre Cherman, astrônomo da Fundação Planetário do Rio. — Por qualquer critério que se olhe, tamanho, massa, idade etc, ele é o número um, o que faz com que seja de suma importância para entendermos não só nossas origens como do próprio Sistema Solar, trazendo informações sobre o que compunha a nuvem original de material da qual nossa estrela e todos planetas se formaram.

Lançada pela Nasa em 5 de agosto de 2011, a sonda Juno percorreu cerca de 2,8 bilhões de quilômetros nesses quase cinco anos até chegar a Júpiter. No caminho, ela passou pelas cercanias de nosso planeta em outubro de 2013 para receber um impulso gravitacional que elevou sua velocidade a mais de 200 mil km/h em relação à Terra para alcançar o gigante gasoso. Além disso, nesta aproximação final, a gravidade do próprio Júpiter está acelerando ainda mais a sonda, que vai ultrapassar os 250 mil km/h, tornando-se um dos objetos mais velozes já construídos pela Humanidade, antes de ter que “pisar no freio” para entrar na sua órbita.

Esta operação, chamada inserção orbital, é um dos momentos mais delicados, e tensos, da missão. Prevista para começar por volta de 23h30 desta segunda (horário de Brasília), a manobra exigirá que a Juno, em “piloto automático” desde quinta-feira passada, acione seu motor principal durante 35 minutos para diminuir a velocidade o suficiente de forma que possa ser capturada pela gravidade do planeta, queimando cerca de dois terços dos pouco mais de 1,2 mil quilos de combustível que carrega.

Se a operação não der certo, a sonda estará condenada a vagar inutilmente pelo espaço, mas os controladores da missão só vão saber se tudo correu bem cerca de 48 minutos depois de seu início e fim, já que este é o tempo que os sinais de rádio levam para percorrer a atual distância entre Júpiter e a Terra, 869 milhões de quilômetros, à velocidade da luz. Por isso, a programação da Nasa de sua transmissão ao vivo pela internet da inserção orbital prevê o começo e término da manobra para 0h18 e 0h53 da madrugada desta segunda para terça respectivamente, também no horário de Brasília.

Na torcida pelo sucesso da manobra também está a brasileira Duilia de Mello. Vice-reitora da Universidade Católica da América, em Washington, e pesquisadora do Centro de Voo Espacial Goddard, da Nasa, a astrônoma espera que, além de informações sobre as origens do Sistema Solar, a sonda esclareça algumas dúvidas sobre os processos de formação planetária, o que ajudará na melhor compreensão das centenas de sistemas descobertos nas últimas décadas em torno de outras estrelas e a possibilidade de existir vida neles.

— Júpiter é um planeta gigante gasoso, mas pode ser que tenha um núcleo sólido, e a Juno vai confirmar isso — conta. — As teorias de formação de planetas atuais vão se subordinar muito aos resultados que a sonda encontrar, pois dependendo do tamanho e densidade do núcleo, poderemos descartar algumas delas. Não sabemos, por exemplo, se o núcleo formou primeiro e depois agregou a atmosfera, ou se formou simultaneamente com a atmosfera.

Segundo Duilia, outro experimento importante neste sentido será a avaliação detalhada que a Juno fará do poderoso e gigantesco campo magnético de Júpiter, cerca de 20 mil vezes mais forte que o da Terra e que se estende entre 1 milhão e 3 milhões de quilômetros na direção do Sol e a mais de 600 milhões de quilômetros no sentido oposto, atingindo a órbita de Saturno.

— A Juno será capaz de mapear o campo magnético de Júpiter e revelar como ele é gerado — aponta. — Isto é importante porque o campo magnético da Terra é essencial para a nossa proteção e foi fundamental para a evolução da vida. Sempre que ocorrem erupções solares, sabemos que as partículas entram pelos polos magnéticos, provocando auroras. Com a Juno, poderemos pela primeira vez entender este fenômeno de perto em um outro planeta. Não podemos fazer isto em Marte, por exemplo, porque o campo magnético marciano é muito fraco.

Ainda na questão sobre o desenvolvimento de vida em sistemas planetários extrassolares, e mesmo em outros lugares que não a Terra no nosso, tanto Duilia como Cherman ressaltam outros papéis importantes que planetas gigantes como Júpiter podem tem neste processo.

— Júpiter sem dúvida ajudou a colocar ordem em nossa vizinhança cósmica — diz Cherman. — Nos primórdios do Sistema Solar, ele agiu como um irmão mais velho que protegeu os demais planetas, em especial os de seu interior, como a Terra, de impactos, atraindo para si objetos como asteroides e cometas desgarrados com sua grande gravidade. E Júpiter nos protege até hoje fazendo isso, e também mantendo estável o cinturão de asteroides entre ele e Marte. Sem Júpiter, estes milhões de asteroides teriam órbitas muito mais aleatórias, o que elevaria o risco de impactos.

Já Duilia lembra que, no caso de muitos sistemas extrassolares, planetas gigantes como Júpiter têm sido encontrados bem próximos de suas estrelas. E embora ressalte que estes “Júpiteres quentes” sejam bem mais “fáceis” de serem encontrados com os métodos atuais para caçar planetas — o que explica porque são tão numerosos entre os conhecidos hoje —, sua presença também pode influenciar na configuração da chamada “zona habitável”, a região da órbita de uma estrela onde teoricamente um planeta não estaria nem perto nem longe demais de forma que sua temperatura permitiria a existência de água em estado líquido na sua superfície, condição essencial para o surgimento e manutenção de vida como conhecemos.

— Planetas gigantes são bem comuns em outros sistemas na nossa galáxia e Júpiter é a chave para entender sua evolução — comenta. — No caso do nosso Sistema Solar, Júpiter e os demais planetas gasosos encontram-se relativamente longe do Sol, são planetas frios, o que não acontece na maioria dos outros sistemas planetários. E isto pode ser bem importante no entendimento da zona habitável, que em nosso Sistema Solar fica entre Vênus e Marte. Ainda não sabemos se sistemas com planetas gasosos quentes teriam zonas habitáveis diferentes, e a Juno vai ajudar a colocar mais umas pecinhas neste quebra-cabeça ao trazer respostas sobre a formação e evolução do Sistema Solar.


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