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Asteroide pode dar pistas sobre a formação do Sistema Solar

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Há cerca de 4,6 bilhões de anos, o Sistema Solar era apenas uma nuvem de gás e poeira que, com o colapso gravitacional, formou primeiro o Sol em seu centro. O material restante começou a se aglutinar em pequenos corpos, conhecidos como planetesimais, que deram origem a planetas rochosos, como a Terra. Ontem, astrônomos do Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês) anunciaram a descoberta do primeiro desses blocos construtores de planetas, que preservou suas características originais no frio intenso da Nuvem de Oort e pode reescrever as teorias sobre a formação do nosso sistema.

— A Terra foi formada pelo acúmulo de planetesimais. O que nós acabamos de descobrir foi um desses planetesimais que poderia ter formado a Terra, mas foi ejetado e passou bilhões de anos congelado — explica Olivier Hainaut, astrônomo do ESO e coautor do estudo publicado na revista científica “Science Advances”.

O raro corpo celeste foi detectado no ano passado pelo Pan-STARRS (Telescópio de Pesquisa Panorâmica e Sistema Rápido de Resposta, instalado no Havaí) como um cometa pouco ativo e batizado como C/2014 S3. Por ter uma cauda curta, ele recebeu o apelido de “cometa manx”, em referência a uma espécie de gato sem rabo. Sua longa órbita, de aproximadamente 860 anos, sugere que sua fonte seja a Nuvem de Oort, nos limites do Sistema Solar. Após a análise da composição, veio a surpresa: diferente dos cometas, que são formados basicamente por água e poeira, o C/2014 S3 é rochoso, como um asteroide.

Os asteroides são velhos conhecidos da astronomia. Eles também são restos da formação dos planetas rochosos, mas se concentram na parte interna do Sistema Solar, num cinturão entre Marte e Júpiter. Por causa da proximidade com o Sol, todo o material volátil evaporou ao longo de bilhões de anos. Esta é a principal diferença do C/2014 S3. No início, os pesquisadores levantaram a hipótese de se tratar de um asteroide que foi ejetado e estaria retornando, mas ele tem uma pequena parte de água em sua composição.

— Nós já conhecíamos muitos asteroides, mas todos foram “cozidos” por estarem há bilhões de anos perto do Sol — explica Karen Meech, do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí e líder do estudo. — Este é o primeiro asteroide não cozido que nós observamos: ele foi preservado no melhor freezer que existe.

CORPO CELESTE EM ESTADO ORIGINAL

O estudo identificou o C/2014 S3 como um típico asteroide tipo S, o segundo mais comum no nosso Sistema Solar, composto basicamente por sílica, mas com órbita similar a dos cometas e uma pequena cauda, formada pela sublimação da água. Para os cientistas, esse é um indício de que o corpo sofreu poucas alterações por ter ficado congelado por um longo período.

Para a astronomia, a descoberta é de relevância extrema. Para ilustrar a importância, Hainaut faz um paralelo com a arqueologia:

— Na arqueologia, você estuda os fósseis de pessoas que viveram há 20 mil anos, mas se encontrasse um espécime congelado, em condições perfeitas, seria muito interessante. Essa é a nossa situação, estamos observando algo extremamente antigo do jeito como foi formado há 4 bilhões de anos — explica. — É a primeira vez que encontramos um bloco construtor de planetas que não sofreu alterações. Nós tínhamos ideia de como ele seria, agora nós sabemos, fizemos medições em um deles.

O astrônomo Jorge Carvano, do Observatório Nacional, afirma que o entendimento sobre a formação do Sistema Solar é um problema em aberto e a descoberta joga nova luz sobre as teorias existentes. De certa forma, era esperado que corpos como o C/2014 S3 existissem, e há tempos astrônomos tentavam encontrar um.

— A cada dado novo, o entendimento sobre a formação do nosso sistema pode mudar. É possível dizer quais teorias funcionam ou não — explica Carvano.

E é isso que os pesquisadores do ESO pretendem fazer. Vários modelos teóricos são capazes de reproduzir as estruturas que existem no Sistema Solar, sendo que uma importante diferença entre eles é sobre os objetos que formam a Nuvem de Oort, com variações nas taxas de objetos formados por gelo ou rocha. Segundo Hainaut, a expectativa é que novos asteroides desse tipo sejam localizados para poderem estimar a relação entre os dois tipos de corpos.

— Sabemos onde e como procurá-los — disse Hainaut. — Dependendo de quantos nós encontrarmos, saberemos se os planetas gigantes dançaram ao longo do Sistema Solar quando eram jovens, deslocando os planetesimais, ou se desenvolveram sem muita movimentação.


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