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Petrobras descarta reduzir preço de gasolina por ora

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RIO E SÃO PAULO – A direção da Petrobras voltou atrás e não vai mais reduzir os preços da gasolina e do diesel no curto prazo. O recuo ocorreu após forte reação dos membros do Conselho de Administração da estatal, que chegaram a classificar a queda nos preços dos combustíveis como “barbaridade”. Para minimizar o estrago, o presidente da companhia, Aldemir Bendine, passou boa parte do dia de ontem tentando contemporizar. Ele enviou e-mail a todos os conselheiros, esclarecendo “que não houve qualquer decisão tomada”.

Além do Conselho de Administração, o mercado financeiro reagiu a uma possível redução nos preços. Ontem, na Bolsa de Valores de São Paulo, as ações preferenciais (sem direito a voto) encerraram em queda de 9,33%, a R$ 7,58. Já as ordinárias (com voto) tiveram recuo de 8,83%, a R$ 9,60 — o maior tombo desde 28 de janeiro do ano passado, quando caíram 10,48%. Segundo Lucas Aristizabal, diretor sênior da Fitch Ratings, uma redução nos preços afeta a qualidade de crédito da companhia e reduz seu fluxo de caixa.

No domingo, o colunista do GLOBO Lauro Jardim informou que a Petrobras iria reduzir os preços dos combustíveis ontem. A notícia, confirmada por fontes, pegou de surpresa os conselheiros, que reagiram imediatamente, cobrando explicações dos diretores da companhia. Na avaliação de especialistas, apesar de existirem argumentos a favor da redução de preços, paira a suspeita de que a medida seria resultado de um pedido do governo, que tenta ganhar apoio popular no momento em que se discute o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Segundo fontes, pelo lado técnico, a estatal considerou reduzir os preços em razão da forte queda na cotação do barril de petróleo no mercado internacional desde meados de 2014 e da retração de 9% no consumo de combustíveis no ano passado e de 10% neste ano.

Após Nelson Carvalho, presidente do Conselho de Administração da estatal, ter enviado mensagem à direção da companhia no domingo, ontem foi a vez de Bendine responder aos conselheiros para acalmar os ânimos. “Diante do noticiário dos últimos dois dias sobre nossa política de preços, gostaria de deixar clara a posição que temos sobre o tema. É dever desta diretoria monitorar permanentemente a composição de todos os nossos custos e também o comportamento do mercado. São estes os fatores que norteiam nossa política de preços. Não há qualquer tipo de politização deste tema”.

efeito no caixa da empresa

No e-mail enviado ontem à tarde, Bendine confirma, pela primeira vez, que a redução dos preços foi discutida. “A retração do mercado consumidor causou o debate se a redução nos preços poderia influenciar na contenção dessas perdas. Não houve qualquer avanço além disso — apenas um debate sobre a elasticidade do mercado neste momento e seus efeitos na nossa estratégia de preços e nos nossos resultados”, destacou o executivo no e-mail.

A mensagem de Bendine foi uma resposta ao e-mail de Carvalho, enviado domingo, quando afirmou esperar que a redução de fato não aconteça. Ele acrescentava, ainda, que a queda no preço da gasolina e do diesel pode “macular o capital de credibilidade e de foco no interesse da companhia”. Em outro trecho, ao qual O GLOBO teve acesso, Carvalho é ainda mais duro e afirma que não tem “propensão a ser equiparado a presidentes do Conselho de Administração do passado, que compactuaram com essa barbaridade”.

— A reação do conselho foi unânime. Todos são contra. Se houver queda nos preços, haverá reação — destacou uma fonte do setor, em referência a uma possível debandada de integrantes do conselho.

De acordo com um executivo próximo à estatal, a mensagem de Bendine aos conselheiros foi importante para “desfazer o ruído” sobre a redução de preços. Segundo ele, a venda da gasolina e do diesel com preços acima dos cobrados no mercado internacional é importante para recompor o caixa da estatal. De acordo com cálculos do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a gasolina está sendo vendida 18% mais caro no Brasil em relação ao mercado internacional. No caso do diesel, a diferença chega a 60%. Com isso, só em janeiro a estatal ganhou R$ 2,4 bilhões.

— Atualmente, parte do caixa da companhia vem sendo gerado por sua política de preços. Se a gasolina e o diesel ficarem mais baratos, isso vai afetar sua geração de caixa e sua qualidade de crédito — disse Aristizabal, da Fitch Ratings.

A estatal enviou comunicado à Comissão de Valores Mobiliários afirmando que “não há previsão, neste momento, de reajuste nos preços de comercialização de gasolina e diesel. Sobre o assunto, vale esclarecer que a Companhia avalia permanentemente a competitividade de suas práticas e condições comerciais”.

Segundo Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora,uma redução não traria mudanças significativas. Silveira ressalta que a Petrobras é “monopolista de fato” e eventuais importações de combustível por distribuidoras não têm volume suficiente para afetar a estatal. A queda nas vendas da Petrobras, para o analista, é resultado da crise.

— Não é hora de baixar preços, pois a Petrobras está com uma dívida gigantesca e um prejuízo enorme em 2015 para recuperar. A medida seria danosa para o processo de recuperação financeira da Petrobras e não aumentaria suas vendas. O governo sempre usou a Petrobras para fazer política de controle da inflação durante anos. Agora é hora de recuperar a capacidade financeira.

motivação em xeque

Thiago Biscuola, da RC Consultores, lembra que a queda nos preços já era esperada, mas não nesse momento.

— O mercado esperava uma redução mais para frente, até para a companhia reduzir suas perdas. Óbvio que a redução nos preços é boa para a economia.

Paulo Figueiredo, diretor de Operações da FN Capital, disse que “em tese” o momento seria adequado para a redução por causa da queda do petróleo, mas que a leitura do mercado é outra:

— O mercado entende que reduzir os preços agora não é por questões estratégicas da companhia, mas uma medida populista do governo.

Os analistas da Yield Capital questionam, em relatório, a motivação da medida. “É apenas parte da política interna da empresa de manutenção da paridade de preços (que não foi verdade desde que a presidente tomou posse) ou seria uma resposta à queda de popularidade e tentativa de manter o governo a poucas semanas da votação do impeachment?”.

(Colaborou Ana Paula Ribeiro)


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